O Dilema das Redes: o ponto cego do usuário que é usado
- 18 de maio de 2022
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Quem gostaria de ler um livro que não tem fim, ou até mesmo um trabalho que nunca é concluído? Com as redes sociais, é basicamente isso que acontece
Camylla Silva
Sabe aquele produto que você simplesmente pesquisou e apareceu como sugestão depois, tendo tudo a ver com o seu gosto? É impressionante como as propagandas “adivinham” o que estamos pensando, mas já parou para pensar como esses conteúdos chegam até você?
O documentário “O Dilema das Redes” foi lançado em fevereiro de 2020, mas viralizou de fato em setembro, depois de ter entrado na Netflix. O longa traz uma oportunidade de entender o que acontece do outro lado das telas de celular, tablets e computadores. A princípio, ex-funcionários de grandes e grandes redes sociais, como Facebook, Twitter e Instagram, são apresentados para discutir sobre as criações e seus funcionamentos.
Disputa pela atenção
O ambiente virtual nos leva a passar cada vez mais horas olhando para a tela do celular, porque as redes sociais precisam da nossa atenção. Quanto mais tempo passamos dentro do Instagram, por exemplo, mais somos expostos a anúncios, e produtos podem ser consumidos. O interessante é que esses anúncios são segmentados por algoritmos, fazendo que apareçam justamente para usuários que tem afinidade com o que está sendo mostrado.
O Dilema das Redes se baseia nas histórias de pessoas como Tristan Harris, ex-engenheiro do Google que tentou alertar os seus colegas de trabalho sobre os riscos das redes sociais, mas infelizmente foi ignorado.
Para Tristan, as redes sociais estão criando uma geração de indivíduos que sempre que se sentirem tristes, solitários ou com medo recorrem a “chupetas digitais”, para se acalmar. Essas “chupetas” são as validações que todos recebem através de corações, curtidas, joinhas, likes e comentários logo depois de postar uma foto. Elas são estrategicamente pensadas para deixar as pessoas presas, manipuladas pelas emoções e vontades, e, talvez, até sujeitas a mudar a maneira de pensar – tudo em troca do tempo.
No documentário, também são mostradas ferramentas que deixam os usuários “vidrados” nas telas, fazendo com que os anunciantes ganhem dinheiro. Um exemplo é a rolagem automática, que foi criada para que a experiência das pessoas não tivesse fim. Quem gostaria de ler um livro que não tem fim, ou até mesmo um trabalho que nunca é concluído? Com as redes sociais, é basicamente isso que acontece.
O objetivo dos donos das redes sociais e dos anunciantes é manter as pessoas o máximo de tempo dentro da rede e consequentemente expor o usuário ao máximo de anúncios.
Efeitos do uso das redes sociais no comportamento humano
Todo meio virtual possibilita que as pessoas fiquem por dentro de tudo que acontece na vida dos amigos, famosos e informações sobre os acontecimentos mundiais. Portanto, o uso exagerado das redes pode causar consequências para a saúde mental. Isso ocorre, em específico, quando se acompanha perfis de determinados padrões de vida e beleza que não podem ser alcançados por todos.
Além do mais, o uso excessivo pode viciar. Segundo dados da Pew Research Center, são mais de 1 bilhão de usuários ativos por mês só no Instagram. Um estudo feito pela entidade de saúde pública do Reino Unido constata que, embora popular, a rede foi eleita a mais tóxica para a saúde mental. Dentre os principais problemas descritos no estudo pelos usuários, estão ansiedade, solidão, depressão, insônia, autoestima e dificuldade de se socializar fora das redes.
Por que usar as redes sociais para fazer jornalismo, já que elas são alvo de fake news?
“As notícias falsas se espalham mais rápido que verdadeiras”. Essa frase aparece no documentário como uma citação de um estudo do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), nos Estados Unidos. “Criamos um sistema que privilegia as informações falsas (…), porque as informações falsas rendem mais dinheiro às empresas do que a verdade”, declara um dos entrevistados. Ele ainda completa: “A verdade é chata.”
O filme mostra que as notícias falsas são amplificadas por meio da “paranoia” de manter as pessoas expostas a anúncios. Esses conteúdos são estimulantes, pois a vontade de clicar em uma notícia de interesse que aparece em recomendações emenda uma fonte na outra, depois uma aba à outra, e, sem perceber, o usuário cai em uma onda de notícias falsas.
A forma como as pessoas consomem conteúdos e informações mudou muito, principalmente pela propagação de internet e o uso frequente das plataformas sociais no tempo livre. Com isso, os conteúdos jornalísticos não são consumidos da mesma forma de anos atrás, quando eram transmitidos pela televisão e compartilhados pelas mídias impressas. Diversos sites de jornais sofrem com a falta de acessos.
Com maior alcance de conteúdos, possibilidade de cobertura em tempo real, interação com o público e identificação de pautas mais relevantes, o jornalismo nas redes sociais se prova mais importante do que nunca. Para muitos, as redes se tornaram a principal forma de consumo de conteúdo.
Se você não estiver pagando pelo produto, você é o produto
Tecnologias bem utilizadas podem ser aliadas do bem-estar pessoal e social, como dão mostra os perfis dos veículos de comunicação no Instagram, Twitter, Facebook e diversas outras redes. É por meio delas que as pessoas se mantêm informadas, dividem momentos importantes e interagem uns com os outros.
Para evitar que a saúde mental de milhões de pessoas seja prejudicada, é importante reforçar que a vida não se restringe ao mundo online. É preciso analisar as possibilidades da vida “real” para que não nos tornemos robôs de nós mesmos. Lembre-se: se você não estiver pagando pelo produto, você é o produto.