A morte de Gugu: um espetáculo para diversos públicos
- 2 de junho de 2021
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Tudo se torna pauta quando existe a certeza do clique, mas nem toda pauta é eticamente aceitável
Isabela Vitória
“Filhos revelam o que diriam para Gugu no aniversário de 62 anos do apresentador” é o título da matéria publicada pela Record em seu site. Até aí tudo bem! É comum que os jornais corram atrás de depoimentos de familiares após o óbito de alguma figura pública. O problema aparece quando analisamos a data de postagem da matéria, 08 de Abril de 2021. Mais de um ano após a morte de Gugu Liberato (21/11/19) e a mídia insiste em sugar a pauta mais do que ela aguenta ser sugada.
Logo que o apresentador morreu fomos exageradamente bombardeados pela notícia em todos os meios de informação. Como foi que Gugu morreu? Onde aconteceu? Quantos anos ele tinha? Perguntas que nem mesmo precisavam ser feitas, foram respondidas. Mas não parou por aí, os questionamentos se tornaram mais complexos com o tempo. Precisava-se retirar o máximo possível do ocorrido. Como uma revista de fofocas, os jornais supriam uma demanda de perguntas irrelevantes. Ele tinha um amante? Seu relacionamento era aberto? Gugu era bi? Com quem fica a fortuna? Tudo isso para alimentar uma pauta que lhes dava engajamento.
Até chegarmos onde estamos hoje, lendo em meios de comunicação sérios, como a Record, sobre o carro de milhões da filha de Gugu que foi guinchado nos Estados Unidos. Onde está a linha nem tão tênue assim, que delimita a marca final da liberdade e o início da ética jornalística?
A filha do Gugu e os não mais anônimos
Se sair do anonimato é difícil até quando se quer, imagina quando não lhe dão escolha. Foi exatamente isso que aconteceu com a família do apresentador, amigos, e até mesmo com os funcionários. Quem a mídia conseguiu, ela relacionou com o personagem. “Ex-funcionário de Gugu morre na véspera do aniversário do apresentador” (UOL); “Filha de Gugu assume namoro nas redes sociais” (F5 – Folha de São Paulo); “ Viúva de Gugu celebra aniversário ao lado dos filhos “coração cheio de gratidão”” (Jovem Pan); entre outros exemplos. São páginas e páginas sobre o que acontece com os conhecidos do apresentador.
Além de perder privacidade, os anônimos perdem também seus rostos e seus nomes, estampados em todo tipo de matéria como “parente do Gugu”. Em um momento as pessoas não fazem ideia de quem você é, e em outro, te conhecem por uma identidade que não lhe representa como indivíduo.
Não existe mais vida pessoal quando o assunto envolve cliques. Por que, afinal, seria má ideia usar da curiosidade alheia para elevar os gráficos após um acontecimento tão chocante? Uma resposta interessante seria, porque o jornalismo não se trata disso, e o entretenimento tem limites… ou melhor, deveria ter.