
Fábrica de notícias
- 4 de junho de 2025
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- Theillyson Lima
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Com 42% da audiência televisiva e 33% do consumo online de notícias, o Grupo Globo lidera o jornalismo brasileiro em múltiplas plataformas.
Isabella Maciel
Por décadas, o jornalismo produzido pelo Grupo Globo ocupou um lugar singular no imaginário brasileiro. Era através de suas diversas plataformas, televisão, rádio, jornal, revista, internet, que o país buscava explicações para os fatos do dia, os detalhes dos escândalos políticos, as imagens das tragédias e os bastidores do poder. Para muitos, se uma notícia não aparecia na Globo, ela simplesmente não era verdade. Hoje, esse protagonismo ainda resiste, mas já não é mais incontestável.
Com mais de 4.700 jornalistas, 600 equipes de reportagem espalhadas por 121 cidades brasileiras e 11 correspondentes internacionais, o conglomerado jornalístico da Globo funciona como uma engrenagem robusta. Seus produtos informativos ocupam quase 11 horas diárias da TV aberta, estão presentes no rádio, no impresso, no digital e no streaming. Mas em tempos de redes sociais, múltiplas narrativas e crescente desconfiança nas instituições, a pergunta se impõe: o jornalismo da Globo ainda é o mesmo? E mais: ele ainda é o principal termômetro informativo do Brasil?
A engrenagem jornalística da Globo
A presença do jornalismo na programação da TV Globo é constante. Segundo a grade oficial da emissora em São Paulo, são cerca de 10 horas e 50 minutos diários dedicados à informação, de manhã à noite: Bom Dia São Paulo, Bom Dia Brasil, SP1, Jornal Hoje, SP2, Jornal Nacional, Jornal da Globo. Mas a televisão aberta é apenas a ponta mais visível do projeto informativo da empresa.
Nos bastidores, o volume de profissionais envolvidos impressiona. De acordo com o site institucional da Globo, são 4.700 jornalistas distribuídos em 121 praças brasileiras, apoiados por 600 equipes de reportagem e 11 correspondentes internacionais. Essa estrutura permite ao conglomerado estar onde a notícia acontece.
Esse compromisso com a informação quente e precisa se traduz em um nível de preparação digno de uma redação que opera no ritmo do hard news. Um exemplo recente, foi a cobertura do conclave.
Segundo a emissora, a Globo preparou com antecedência 37 perfis diferentes de possíveis papas, prontos para serem publicados conforme o resultado da eleição. A estratégia não é exceção, mas um retrato da lógica que move a engrenagem jornalística do grupo, que é antecipar cenários, reagir com rapidez e garantir que o público receba, no tempo certo, a informação mais completa e confiável possível.
Esse grau de prontidão ajuda a explicar por que a Globo ainda é, para muitos, sinônimo de notícia.
Transmídia
O jornalismo da Globo não se limita à TV. Ele está presente em um ecossistema integrado que vai da televisão ao streaming, passando por rádio, internet e veículos impressos. Essa estratégia amplia a compreensão da marca e transforma a Globo no maior conglomerado de mídia da América Latina.
Na TV paga, a GloboNews, primeiro canal de notícias 24 horas do Brasil, mantém audiência abaixo de 90 mil pessoas, mesmo nos picos de exibição. Segundo dados de dezembro de 2024, seu melhor desempenho ocorre no período da tarde, quando atinge, em média, 88.502 espectadores. No rádio, a CBN se posiciona como “a rádio que toca notícia”, com atualização constante em rede nacional.
Na internet, o G1 funciona como o braço digital das redações, sendo líder no jornalismo digital e oferecendo conteúdo em tempo real, reportagens especiais, checagens de fatos e reprodução dos noticiários televisivos. Já no streaming, o Globoplay apresenta documentários investigativos e séries jornalísticas, como “Marielle”, o crime que abalou o Brasil e “Em nome de Deus”.
E há ainda o jornalismo impresso e digital, sendo que “O Globo” e o “Valor Econômico” são referências em cobertura política, econômica e institucional. O primeiro, fundado em 1925 por Irineu Marinho, é o principal jornal da casa, com circulação nacional e influência no debate político. O segundo, lançado em parceria com o Grupo Folha, se consolidou como um dos maiores jornais de economia e finanças do país. Ambos migraram com força para o digital nos últimos anos, oferecendo assinaturas, paywall e produção multimídia.
O que é o jornalismo da Globo?
A Globo apresenta seu jornalismo como sinônimo de responsabilidade, isenção e imparcialidade, valores reiterados em campanhas e documentos institucionais. Desde 1925, quando O Globo foi fundado, o grupo tem sustentado que seu êxito é resultado direto do bom jornalismo praticado. Embora admita erros ao longo da trajetória, a empresa afirma que os acertos superam as falhas, o que justificaria sua posição de liderança no cenário midiático.
Do “Jornal Nacional” às colunas de opinião do O Globo, passando pelos comentários na CBN e pelas análises na GloboNews, o jornalismo do grupo constrói uma linguagem padronizada: tom sóbrio, estética limpa, vocabulário técnico e postura de neutralidade.
Além disso, o posicionamento editorial da Globo sempre foi objeto de controvérsia. Durante a ditadura militar, a emissora foi acusada de omitir abusos do regime. Na redemocratização, o caso mais emblemático foi a edição do debate entre Lula e Collor, em 1989, cuja manipulação de imagens foi posteriormente reconhecida como um erro em documentário produzido pela própria emissora.
Mais recentemente, a cobertura da Operação Lava Jato, do impeachment de Dilma Rousseff e da pandemia de Covid-19 também foram alvos de debates sobre imparcialidade, escolha de fontes e enquadramentos narrativos. Em todos os casos, o jornalismo da Globo exerceu protagonismo, e também protagonizou polêmicas.
Quando a Globo fala, o Brasil escuta?
Ao longo das décadas, a Globo ajudou a formar a memória coletiva do país. A maneira como um fato era narrado em suas páginas, ondas ou telas influenciava diretamente a forma como a população o entendia. O poder de pautar debates e estabelecer consensos foi, por muito tempo, quase exclusivo.
Mas esse cenário mudou. A digitalização da informação, o surgimento de mídias alternativas e o crescimento das redes sociais fragmentaram a audiência e diluíram a autoridade das grandes marcas jornalísticas. Mesmo veículos tradicionais como “O Globo” e a GloboNews viram sua influência ser contestada por influenciadores, podcasts, youtubers e sites de viés político.
A Globo reagiu com reformulações: novos formatos visuais, linguagem informal nos perfis digitais, ampliação da checagem de fatos, contratação de jornalistas mais conectados ao ambiente digital e reforço no discurso de combate à desinformação. Mas ainda precisa lidar com a desconfiança de parcelas da população que a veem como parte de uma “mídia hegemônica”.
Essa tensão entre tradição e inovação, entre autoridade e desconfiança, é um dos maiores desafios do jornalismo contemporâneo e, especialmente, da Globo, que por décadas foi sinônimo de verdade institucionalizada.
Espinha dorsal do Grupo Globo
Na estrutura empresarial do Grupo Globo, o jornalismo ocupa papel central, não apenas editorial, mas também simbólico. É ele que ancora a credibilidade da marca, legitima sua influência e sustenta a conexão com diferentes gerações de brasileiros.
Mais de dez horas por dia são dedicadas ao conteúdo jornalístico só na TV aberta, sem contar o volume produzido em rádio, internet, impresso e streaming. Nomes como Renata Vasconcellos, William Bonner, Renata Lo Prete, Merval Pereira, Miriam Leitão e Carlos Alberto Sardenberg são rostos e vozes que moldam a narrativa informativa do grupo.
Com uma estrutura de mais de 4.700 jornalistas e presença em todas as plataformas, a Globo se posiciona como uma “indústria de notícias”. Mas sua missão não pode se limitar à velocidade ou ao volume. Em tempos de polarização, ruído e crise de credibilidade, o maior desafio é sustentar a relevância sem abrir mão da escuta e continuar se reinventando para acompanhar a geração com novos desafios de se conectar com a informação.