Kidding: duas temporadas de amor e culpa
- 2 de junho de 2021
- comments
- ABJ Notícias
- Posted in Sessão Cultural
- 0
A magia do Universo Pickles foi atropelada por um caminhão de sorvete
Esther Fernandes
O Yin Yang é um conceito filosófico de grande importância na cultura chinesa. Ele representa o equilíbrio e a harmonia durante a vida. Essa filosofia é muito bem-estruturada na série “Kidding”, protagonizada por Jim Carrey. A ideia de equilíbrio e harmonia representa o oposto da construção da série mas, ao mesmo tempo, a concepção de bem e mal é, a todo momento, apontada na trama de maneira sensível e questionadora.
Jeff Piccirillo é um apresentador de programa infantil de grande sucesso, com franquias espalhadas pelo mundo inteiro. Apesar da fama, ele vive de maneira simples e sem luxo, apenas ostentando sua família perfeita e amor para com o próximo. Entretanto, toda essa estabilidade vai por água abaixo quando um trágico acidente de carro mata um de seus filhos gêmeos, desestruturando seu casamento e consequentemente as demais áreas de sua vida.
Desde de sua juventude, quando começou o programa infantil, Jeff ou Mr. Pickles vive em um sistemático código de ética onde a generosidade e o amor vem acima de tudo e todos (irônico, não?) e no qual não há lugar para “sentimentos ruins”. O luto por seu filho despertou nele uma série de indagações acerca de suas emoções, além de desbloquear loucuras e insanidades não vividas por ele, até então.
Um dos grandes combustíveis para os acontecimentos da série é o fato do protagonista não conseguir viver o luto em sua totalidade. As angústias reprimidas por Jeff pela perda de seu filho geram ataques de raiva que vêm acompanhados de profundo arrependimento. Essa característica não é exclusiva do apresentador. Toda sua família lida de diferentes maneiras com o luto, porém entre as divergências há uma similaridade: a culpa.
A Mrs. Piccirillo se culpa por estar dirigindo o carro no momento do acidente. Mr Pickles culpa a esposa por não obrigar o filho a usar cinta de segurança e o filho sobrevivente culpa o pai por ser idiota. De fato, a consciência da culpa ou sua atribuição ao outro está intrinsecamente ligada ao valor de bem e mal, segundo estudos de Nietzsche. Em “Kidding” as investigações desses aspectos ganham uma análise significativa e necessária.
Apesar da onda de catástrofes, a série oferece, ocasionalmente, momentos de respiro. Cenas de genuíno amor são trazidas como um descanso ao telespectador, como um novo fôlego para o retorno ao caos. Esse é o conceito do Yin Yang e também as “consequências” do luto.
A morte causa diferentes reações e gera as emoções mais distintas, que vão desde raiva até compaixão. O paralelo que a série traz é de que mesmo um homem bom, pode virar um completo imbecil e um imbecil pode fazer uma boa ação. O Luto despertou em Jeff o “Yin” e reforçou o seu “Yang”.