Um guia para entender desmatamento e queimadas na Amazônia
- 30 de setembro de 2019
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- Thamires Mattos
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Com a repercussão em outros países, mais uma vez, o Brasil e a atual gestão no governo são alvos de cobrança em relação aos incêndios Amazônia
Walace Ávila
As manchetes sobre fogo e desmatamento na Amazônia não são recentes. Há anos, se sabe da luta para preservar o patrimônio da biodiversidade, do combate em conter garimpos e madeireiros ilegais, grupos ambientais e ONGs que unem esforços em barrar e denunciar os crimes ambientais. Em outras palavras, o assunto não é algo tão novo. Porém, a notícia voltou em alta na mídia brasileira neste ano, e traz alguns questionamentos: será que houve aumento considerável de queimadas e desmatamento no ano de 2019? Por que a repercussão tomou rumos internacionais? E qual a razão da forte cobrança em cima do atual do Governo?
Antes, é preciso entender que os incêndios são comuns nos meses de julho a setembro. Esse é o período da seca, e há poucas chuvas na região Norte do país. Agropecuários, produtores rurais e latifundiários também costumam praticar queimadas controladas sobre suas terras para agilizar o processo de renovação do solo, abrir pastagem e espaço para agricultura e alguns desses incêndios podem alastrar-se até áreas de preservação. Entretanto, incêndios controlados em áreas rurais necessitam de autorização e acompanhamento de órgãos públicos estaduais, e, especificamente no período da seca, as queimadas controladas são proibidas. Quando praticadas de maneira irregular e sem a devida orientação, configura-se crime ambiental, e está sujeita à multa e detenção de seis meses a um ano.
A Amazônia é um de diversos biomas brasileiros, como Cerrado, Caatinga, Pampa, Mata Atlântica e Pantanal. Há anos é a vegetação mais afetada por incêndios florestais e desmatamentos, sejam eles controlados ou ilegais. De acordo com o Programa de Queimadas, realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o número de focos de incêndio, até o momento, é de 64126 na Amazônia, 46% maior comparado ao ano anterior. Se pegarmos os dados dos seis biomas e a quantidade de focos de incêndio identificados, o número é mais chocante: foram 140054 focos registrados em 2019, um aumento de 55% em comparação à 2018. Desde 2010, não tínhamos um registro alto, crescente e de maneira descontrolada. Além do bioma amazônico, o cerrado, já conhecido por sua vegetação seca e com baixa umidade, também enfrenta problemas com as queimadas: já são mais de 49 mil focos registrados neste ano. Países nas fronteiras também registraram focos de incêndio como o Peru, Bolívia e Argentina.
Resultados negativos
Em decorrência da proporção dos incêndios, a fumaça causada espalhou-se pelos demais estados brasileiros e países nas fronteiras. A Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa) divulgou imagens de satélite, que mostra com clareza as manchas acinzentadas nas regiões.
Na foto acima é perceptível o acúmulo de fumaça na região Norte. Como se já não bastasse o incêndio e o acumulo das fumaças, outro fato chamou a atenção: na tarde de segunda feira, 19 de agosto, mais ou menos as 15h, atipicamente, a cidade de São Paulo escureceu mais cedo. Outros estados também relataram certo escurecimento precoce durante o dia.
Juntando todos os fatores: queimadas, fumaças vistas por satélites da Nasa e o escurecimento precoce nos estados e em São Paulo, a repercussão foi além da convencionalidade.
Canais internacionais como The Washington Post e The Guardian publicaram dados do Inpe e divulgaram imagens dos incêndios. Em resposta rápida aos incêndios, empresas estrangeiras como Timberland, Kipling e Vans confirmaram o corte da compra do couro brasileiro, até que se prove que o produto é seguro e que sua extração não contribui com a crise ambiental.
Cobrança e pressão em cima do governo Bolsonaro
O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, nomeou Ricardo Salles como Ministro do Meio Ambiente. Suas primeiras medidas já causaram polêmica. Salles demitiu 21 dos 27 superintendentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Promoveu revisar as multas, e, como consequência, de janeiro a agosto, a aplicação caiu em 29%. Ricardo também discursou para madeireiros e foi aplaudido por estes.
Em março, um funcionário que aplicou multa em 2012 a Bolsonaro por pesca irregular foi exonerado. Em Fernando de Noronha, Salles transferiu um funcionário especialista na preservação de golfinhos para outro parque, no interior de Pernambuco, após críticas realizadas por Bolsonaro aos valores cobrados por entrada no parque nacional.
Ainda em março, na política defendida pelo Presidente e seu governo de contingenciamento de gastos, Bolsonaro restringiu R$ 244 milhões do Ministério do Meio Ambiente. O corte dificultou diretamente os programas de fiscalização e combate aos incêndios florestais.
Em maio, Ricardo Salles fez críticas à administração do Fundo Amazônia, criado em 2008 com doações de países europeus para preservação da floresta. Alegou, sem provas, que o dinheiro era desviado e usado de maneira irregular. Em retaliação, Alemanha e Noruega cortaram as doações e ameaçaram extinguir a iniciativa.
Com tantas medidas executadas pela gestão atual que inviabilizam o trabalho na preservação da Amazônia, a oposição responsabiliza o Presidente pelo descontrole dos incêndios. Em resposta à pressão popular e mundial, o Jair Bolsonaro alegou, em 21 de agosto, que ONGs poderiam estar por de trás dos incêndios, já que não recebem mais os repasses da União.
A preservação da Amazônia, o programa de queimadas do Inpe, o Fundo Amazônia e programas de fiscalização realizados pelo Ministério do Ambiente dependem de verbas e apoio do governo. Com ameaças de países estrangeiros no corte de doações e a retirada de investimentos, o Brasil caminha para mais dias escuros inesperados, como na tarde fatídica de 19 de agosto.