Vilões imaginários
- 16 de junho de 2021
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Teorias da conspiração são comuns e se acentuam em tempos de crise. E os motivos para isso vão além de mera ignorância. É algo psicológico que está relacionado com o sentimento de pertencimento.
Matheus Figueiredo
Em 2020 foi normal ouvir falar que o “coronavírus foi criado em laboratório” ou que “chineses querem dominar o mundo”. No hemisfério norte também se falou muito que o “5G foi o responsável pela contaminação”, e até mesmo que “as antenas de rádio enfraqueceram a população”. É comum que, em tempos de crise, muitos acreditem em teorias sem embasamento científico e acabem se revoltando contra coisas que não existem, como aconteceu em muitos países. Protestos que tinham como pauta o fim do 5G ou o afrouxamento de medidas contra o “vírus chinês” são movimentos vazios e que escondem problemas reais.
Os períodos de grandes incertezas, como pandemias, guerras ou de grandes mudanças, trazem questionamentos para grande parte da população. Em uma entrevista à BBC Brasil, o professor de psicologia cognitiva, Stephan Lewandowsky, explica que as pessoas acreditam nessas histórias por sentirem que estão perdendo o controle sobre suas vidas. Segundo ele, essas teorias da conspiração as acalmam, pois começam a ter quem culpar pelo momento que estão vivendo. Elas direcionam a frustração para esse “inimigo”, mesmo que seja uma história inventada.
Na época da gripe espanhola, em 1918, muitos já falavam em curas milagrosas, enquanto alguns não acreditavam na letalidade do vírus. A história se repetiu com o Coronavírus. Muitos (ainda) defendem remédios ineficazes, atacam a vacina e negligenciam a doença. Mas por quê? Seria apenas uma ignorância trágica?
O doutor em história, Leandro Gavião, explica em seu artigo “Ciência e teorias da conspiração em tempos de pandemia”, que uma das formas de responder essas perguntas, é analisando a complexidade do ser humano, que precisa de coisas que vão além de descanso e alimentação. Persegue um lugar de pertencimento, ou mesmo entendimento do porquê de sua existência. Essa necessidade de respostas, ou de se sentir parte de algo maior, faz com que ele se junte a grupos específicos. Suas crenças começam a se alinhar com o que ouve, ele começa a reproduzir discursos dessa comunidade e defende seus ideais com todas as forças.
O porta-voz da insanidade
Essa perseguição por respostas a coisas que estão além da compreensão humana, faz com que qualquer resolução, mesmo que sem embasamento científico, seja aceita e reproduzida. Quando o grupo a que essa pessoa pertence constrói um discurso, ele vai ser reproduzido por todos que estão dentro dele. É por isso que os protestos citados neste texto são feitos por pessoas com ideologias parecidas. Elas se sentem abraçadas por este movimento e o defendem fervorosamente, mesmo com a imprensa e a internet desmentindo todas as suas crenças.
Tudo que esse grupo de pessoas precisa é de alguém que os represente, que “vista a camisa” de seus ideais. Um porta-voz para seus devaneios. No Brasil, quem assumiu essa figura foi o presidente Jair Bolsonaro. Um estudo feito por pesquisadores acadêmicos concluiu que 20% das menções, na rede social do mandatário, sobre políticas externas, são baseadas puramente em teorias conspiratórias. Mais de 40% dos posts em geral também têm esse teor conspiratório. Essas ideias foram adotadas pela grande massa de apoiadores do governo e são tidas como verdades absolutas por seus seguidores.
Teorias da conspiração podem ser perigosas, prova disso são todas as movimentações populares que as têm como pauta. Um governo pode escolher combatê-las com firmeza ou as utilizar como “cortina de fumaça”. No caso do Brasil, um presidente foi eleito e continua embasando e sendo condescendente com essas práticas. Segue usando a luta contra vilões inexistentes como bandeira ideológica, para se divulgar, enquanto o real vilão (Coronavírus) está matando milhares de pessoas diariamente.