Ser negro: defeitos e qualidades do Ministro
- 13 de outubro de 2015
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- Thamires Mattos
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O discurso racista é da mídia. Seja ela de esquerda ou de direita. É de um povo enraizado em uma cultura elitista, filha dos latifundiários exploradores.
Sudaleif Alves
O ministro Joaquim Barbosa foi uma das figuras públicas brasileiras mais comentadas em 2013. Também foi eleito pela revista americana Time como uma das cem pessoas mais influentes do mundo naquele ano. Contudo, antes mesmo de ser eleito presidente do STF, em 2012, a mídia já vinha aprimorando seu discurso a respeito de Barbosa.
Pós eleição, dentre os discursos esquerdistas que voltaram suas atenções ao ministro, podemos citar o exemplo do jornalista Ricardo Noblat. O jornalista mantém uma página na internet, o Blog do Noblat . Após quatro dias de discussão entre Barbosa e Lewandowski, durante o processo do Mensalão, Noblat se manifestou em sua página com um texto que trazia dizeres suspeitos no título. “Joaquim Barbosa: fora do eixo”. Na primeira frase da publicação, “quem o ministro Joaquim Barbosa pensa que é? ”, o jornalista já definia o tom que sua análise sobre o comportamento do ministro durante as discussões acaloradas teria.
De acordo com ele, para entender Barbosa “é preciso acrescentar cor a sua cor. Há negros que padecem do complexo de inferioridade. Outros assumem uma postura radicalmente oposta para enfrentar a discriminação”. Em outro momento, afirma que Joaquim foi descoberto por um caça-talentos de Lula, “incumbido de caçar um jurista talentoso e… negro”. Sem citar embasamento ou fontes, Noblat encerra o texto com duas alegações contra Barbosa.
Primeiro, disse que falta a Barbosa grande conhecimento de assuntos de direito e que essa é uma opinião quase unânime de juristas de primeira linha “que preferem não se identificar”. O segundo ataque se referia a escolha de Barbosa para o cargo. Segundo o jornalista, quando Lula aprovou o nome de Barbosa como ministro teria dito “não vá sair por aí dizendo que deve sua promoção aos seus vastos conhecimentos. Você deve à sua cor”. Devido a essas e outras citações, Barbosa processou Noblat por crimes contra a honra e por delito racial. O uso do título, das claras citações, dos comentários em parênteses como “Que não perca a vida por excesso de elegância (esse perigo ele não corre) “, transpõe os limites da parcialidade jornalística e da objetividade quanto a pauta.
Em veículo oposto, mas não diferente no ataque a Joaquim Barbosa, Reynaldo Azevedo, colunista da Veja , demonstrou como o veículo transitou em opiniões opostas no “antes” e “depois” da atuação de Barbosa no caso Mensalão. No decorrer do processo, Azevedo afirmou que os próprios petistas eram racistas porque cobravam do ministro que, por ser negro e estar na posição devido a indicação do ex-presidente Lula, devia favorecer ao partido absolvendo os suspeitos petistas.
Contudo, antes de Barbosa aparentemente começar a prestar serviço à direita (fato acontecido durante o julgamento), o mesmo Azevedo tinha outra postura contra o ministro. Em abril de 2009, afirmou em um dos títulos de sua coluna que “Joaquim Barbosa desmoralizou o Supremo” na discussão com o então presidente do STF, Gilmar Mendes. Acrescentando que Barbosa agia como se tivesse um saber jurídico superior a de seus pares, deu ênfase, quase que audível, em sua análise: ” ele não tem. Não tem mesmo!!!” Encerrou o texto dizendo “heroísmo nada”.
Azevedo confundiu seus leitores. Que depois de tanta casaca mudando de lado pareciam não concordar com mais nada. Questionado sobre suas preferências (ou não) ao ministro, intitulou um de seus textos: “Elogios à atuação de Barbosa aqui??? Nem pensar!!!”.
Em setembro de 2009 publicou outro título pra lá de polêmico: “A arrogância de Barbosa é espantosa”. Em agosto de 2010 sintetizou mais pareceres em novo título. “Ou Joaquim Barbosa volta ao trabalho ou tem de se despedir”, insinuando que a alegação do ministro com dores na coluna para se afastar do STF era desculpa. Nos títulos usados por Azevedo nas matérias sobre Joaquim Barbosa em 2009-2010, a expressiva pontuação, escolha de adjetivos contundentes, a construção de locuções como “não tem mesmo” e “heroísmo nada” transparece a interferência tendenciosa do autor.
Há um discurso racista e antipático, explícito ou velado, tanto em Ricardo Noblat (na esquerda) quanto em Reynaldo Azevedo (na direita) sobre Joaquim Barbosa. Motivado por divergentes pressupostos e visando múltiplos objetivos com a propagação desse discurso, a análise apenas desses dois veículos de comunicação, sugere que o racismo não pertence a mídia de esquerda ou direita. Coexiste em ambas. Sem a sentença de condená-los ou vitimá-lo, coexiste em um antecedente histórico de Noblat’s, Azevedos e Joaquins por aí afora. É um discurso de uma política fortemente elitista e preconceituosa, nascida no berço latifundiário aristocrata de um país colonizado via exploração.