Queimadas em alta, vozes em baixa: onde estão os artistas agora?
- 25 de setembro de 2024
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- Theillyson Lima
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O ativismo nas redes sociais nãoa tua como um grito de indignação, mas como um sussurro de conveniência pela troca governamental.
Davi Sousa
O Brasil de 2024 queima. As queimadas devastadoras ameaçam a Amazônia e o Pantanal, mas o que arde ainda mais forte é o silêncio dos que antes eram vozes ativas. Em 2020, artistas e influenciadores lotavam as redes sociais, “clamando” por justiça ambiental. Campanhas como “#PrayForAmazonia” ecoavam, e figuras como Caetano Veloso e Wagner Moura se tornaram ícones da luta contra o governo Bolsonaro, que era rotulado de “genocida”.
Agora, em 2024, os números ainda são preocupantes. Com 68.635 focos de queimada registrados em agosto, o cenário é ainda mais sombrio do que há quatro anos. Porém, onde estão as vozes que antes se levantavam? O silêncio ensurdecedor frente à gestão de Lula, que apresenta resultados ambientais igualmente ou mais trágicos, levanta questões que nos fazem ficar inquietos. O ativismo estava mesmo preocupado com a causa ou era apenas uma forma de capitalizar em cima da indignação popular?
Enquanto a Amazônia arde, o mesmo grupo que clamava por mudança agora se esconde. O governo, que deveria ser alvo de críticas severas, é tratado com tolerancia absoluta. Artistas que antes organizavam protestos agora permanecem calados, como se a urgência ambiental tivesse diminuído. A Gazeta do Povo destaca que as queimadas de 2024 superam até o pior ano de Bolsonaro, mas a indignação parece ter desaparecido.
A dura realidade é que, quando criticar se torna arriscado, o ativismo digital se apaga. Essa omissão revela uma verdade um tanto incômoda que muitos influenciadores estavam mais preocupados em manter a imagem do que em lutar por uma causa. O fogo não parou de queimar, mas a chama da mobilização se apagou.
Em um momento em que a natureza clama por ajuda, o que nos resta é questionar a sinceridade desse ativismo. Quando a crítica se torna inconveniente, muitos preferem ignorar o que está à vista. O Brasil arde, mas, infelizmente, o silêncio ecoa mais alto.
Como os artistas mudaram de postura nas redes sociais
A quatro anos atrás cantores, atores e influenciadores usavam sua visibilidade para se posicionar contra o governo Bolsonaro, criando uma atmosfera de pressão e mobilização. Campanhas de conscientização eram vistas diariamente, e o apoio à causa ambiental tornou-se um “passe livre” para a aceitação social.
Um exemplo marcante desse ativismo foi o de Leonardo DiCaprio, conhecido por sua defesa do meio ambiente. Durante o governo Bolsonaro, DiCaprio foi uma das vozes internacionais mais críticas ao desmatamento da Amazônia. Em 2019, quando as queimadas devastaram a região, ele usou suas redes sociais para condenar o governo, destacando a necessidade urgente de ações mais efetivas para proteger a floresta. Ele chegou a ser acusado pelo próprio Bolsonaro de financiar organizações que, supostamente, teriam responsabilidade pelos incêndios, o que só intensificou o embate entre o ator e o governo brasileiro.
Em 2024, diante de um governo mais alinhado às suas visões políticas, a postura de DiCaprio mudou. A quantidade de queimadas no Brasil não diminuiu e, em muitos aspectos, piorou. O governo Lula, que havia prometido um novo tratamento para questões ambientais, viu os números de incêndios dispararem. De janeiro a maio de 2024, o Brasil registrou o maior número de queimadas de sua história, superando até os piores momentos da gestão Bolsonaro. Entretanto, o silêncio de figuras como DiCaprio é ensurdecedor. As críticas que ecoavam nas redes sociais agora são substituídas por um afastamento notável, refletindo uma mudança óbvia de prioridades e interesses.
O ativismo estético
No início de setembro, a NFL fez história ao realizar seu primeiro jogo na América do Sul, em São Paulo. A apresentação de Luisa Sonza, que interpretou o hino nacional brasileiro, chamou a atenção não apenas pela sua performance, mas pelo look criado pelo designer paraense Normando. Com mensagens sutis sobre a preservação da Amazônia, a peça, feita de materiais ecológicos como algodão Pima e látex amazônico, buscava alertar sobre a crise ambiental.
A escolha de Sonza foi amplamente destacada pela imprensa, incluindo o Globo, que noticiou o evento e o significado por trás de seu visual. A roupa, enfeitada com um laço e mangas que exibiam a mensagem “Salve a Amazônia”, visava chamar atenção para a crise ambiental durante um evento de grande visibilidade.
Mas por outro lado essa apresentação ilustra como o ativismo pode se reduzir a uma performance visual, deixando de lado intervenções mais eficazes. Embora o look tenha gerado buzz e visibilidade, ele também revela a tendência de usar a estética como um substituto para ações diretas e impactantes. Chamou a atenção, mas não substitui a necessidade urgente de políticas e ações concretas para enfrentar a crise ambiental.
O ativismo estético, apesar de aumentar a visibilidade e provocar discussões superficiais, frequentemente falha em abordar as causas de maneira significativa. O visual marcante de Sonza, embora bonito, não substitui a necessidade de um engajamento mais profundo e efetivo contra a destruição da Amazônia. Em um momento crítico, é essencial que as vozes da arte e da cultura não se limitem ao espetáculo, mas que se transformem em ação real.
Anitta: o novo padrão de posicionamento?
Anitta é uma das vozes mais influentes do Brasil, mas seu ativismo é realmente eficaz ou se resume a gestos simbólicos? Considerada uma das personalidades mais poderosas do país por veículos de mídia nacionais e internacionais, a artista sempre foi clara em seus posicionamentos. Mas, durante as eleições de 2018, sua postura reservada gerou controvérsia e levou a cantora a ser “cancelada”, perdendo apoio de fãs de ambos os lados políticos.
Recentemente, Anitta cobrou medidas concretas dos políticos em relação à crise ambiental, sinalizando uma mudança em sua abordagem. Mas essa cobrança foi feita em um perfil de menor visibilidade, o “QG da Anitta”, com 1 milhão de seguidores, e não na sua conta principal, que tem cerca de 68 milhões. Essa escolha sugere uma transformação na estratégia de posicionamento de marca da artista.
O uso de redes sociais menores para abordar questões tão sérias pode ser interpretado como um ativismo de baixo impacto. Embora Anitta tenha expressado preocupações e pedido ações, a falta de um compromisso mais visível e acessível reflete uma tendência de superficialidade crescente no ativismo das celebridades.
Essa mudança se encaixa em um padrão mais amplo, no qual o ativismo parece mais voltado para a manutenção de uma imagem pública positiva do que para um engajamento real. O caso de Anitta expõe como o ativismo pode se resumir a gestos simbólicos, evitando desafios diretos aos poderosos e promovendo mudanças relevantes.
A questão que fica é, em um momento em que a urgência das crises ambientais clama por ação, o que podemos esperar de figuras tão influentes? O ativismo deve ir além da superfície e se transformar em um compromisso genuíno com a mudança.
Quem está fazendo a diferença nas redes sociais?
Vamos ser diretos, o que estamos vendo nas redes sociais e na mídia é um ativismo superficial, brilhante por fora, mas vazio por dentro. Onde foi parar a indignação que incendiava as timelines em 2020? Agora, com a troca de governo, o que nos resta é um silêncio ensurdecedor, como se os gritos de protesto tivessem sido abafados por uma onda de indiferença.
Quem são os verdadeiros agentes de mudança que seguimos? As mesmas figuras de sempre, que mudam de lado conforme a maré política? E a mídia, está apenas alimentando um circo de vaidades ou realmente investigando as promessas vazias que se espalham por aí?
É hora de refletir se estamos sendo engajados em causas reais ou apenas entretidos por um espetáculo bem ensaiado. A superficialidade do ativismo digital já não engana mais. A sociedade pede por ações concretas, não de posts que se perdem no desenrolar do feed. A verdadeira mudança não se resume a palavras impactantes, mas sim às ações que realmente moldam e impactam nossa realidade.
Se a mídia e os influenciadores não estão cumprindo seu papel, então é hora de exigir mais. A mudança que buscamos não pode ser apenas uma hashtag de moda, deve ser um compromisso verdadeiro com um futuro mais justo e sustentável. Chegou a hora de confrontar essa superficialidade e demandar uma transformação real, porque a diferença genuína acontece nas ações, não nas aparências.