Para não esquecer
- 14 de abril de 2020
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- Thamires Mattos
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A tensão e o medo durante uma pandemia se dão não apenas pela doença em si, mas porque não estamos aptos a combatê–la
Djuliane Rodrigues
Início de 2009. O Brasil prosseguia dando pequenos passos para se recuperar da crise econômica causada pela bolha econômica dos EUA. O PIB não atingia o esperado pelos economistas por dois trimestres consecutivos. Em maio de 2009, foram registrados 20 infectados pelo vírus H1N1 em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. Ao final de junho, 627 pessoas em todo o país estavam contaminadas. A primeira morte aconteceu no Rio Grande do Sul. Cerca de 17 mil pessoas morreram de Gripe A (doença causada pelo vírus). A Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou estado de calamidade e pandemia quando o vírus se espalhou pelo México, e, em seguida, por todo o mundo.
O mais intrigante era que o vírus atingia crianças, mas a alta taxa de letalidade estava entre os jovens, ao passo que os da terceira idade não faziam parte do grupo de risco. Na época, médicos especialistas não sabiam explicar o porquê de idosos estarem praticamente “imunes” ao vírus. Por conta disso, a população começou a ficar amedrontada. Notícias provocavam tensão. Nesse caso, o medo estava associado à doença. No livro Epidemics and ideas, o historiador Paul Slack chama a atenção ao fato de que a forma como as doenças foram percebidas no passado, bem como as reações que despertaram, assumiram configurações distintas segundo diferentes elementos. Dentre eles, destaca: a) o caráter de novidade ou de familiaridade da doença; b) a violência da epidemia, medida em termos de seu grau de mortalidade e sua duração no tempo; c) a incidência geográfica e social; e d) seus antecedentes de mortalidade e morbidade.
No entanto, um elemento que se destaca é que essa grande tensão e medo se dão não apenas pelo vírus em si, mas porque não estamos aptos a combatê- lo. Caso houvesse uma superlotação no Sistema Único de Saúde, estaríamos desprotegidos. Essa sensação é fortemente marcada pela escassa presença do poder público brasileiro. Em meio ao caos, cada autoridade se posiciona em lados opostos frente ao problema vigente. Isso aconteceu durante a pandemia de Gripe A. Se de um lado tínhamos a Organização Mundial de Saúde alertando sobre os perigos da doença e sugerindo cuidados de higiene pessoal, o mesmo não pode ser dito quanto às autoridades brasileiras da época. O então Ministro da Saúde afirmou que “não há motivos para pânico e que o país está preparado para combater a doença” (O MUNDO, 02/05/09). Para os meios de comunicação, a questão da letalidade do vírus desde o início se configurou como um tema importante na cobertura jornalística. A ideia de morte já era algo especulado pelos especialistas e jornais; e, logo depois da primeira fatalidade, no Rio Grande do Sul em 28 de junho de 2009, menos de dois meses antes do vírus se espalhar pelo país, o medo se concretizou.
Hoje, o H1N1 não é mais uma ameaça tão grande quanto em 2009. Já existe uma vacina para prevenção disponibilizada pelo SUS. A procura, no entanto, nem sempre é alta. Em 2016, houve um aumento no número de casos: 5411. 886 pessoas morreram. Isso nos deixa com a triste sensação de que, sem a movimentação midiática, esquecemos de doenças que nunca foram realmente embora.