“Ninguém é imune ao medo”
- 5 de abril de 2016
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- Thamires Mattos
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Camila Torres
Basta uma câmera na mão e acesso à internet para que uma pessoa possa compartilhar com o mundo o que acabou de acontecer diante de seus olhos. Palco de discussões em todas as esferas do conhecimento, o uso da internet em casos de interesse e segurança nacional causa polemica. Principalmente se a pauta em questão é uma doença nova, que ceifa uma centena ou até milhares de vidas sem explicação.
O filme Contágio (Contagion), dirigido por Steven Soderbergh e escrito por Scott Z. Burns, traz no enredo o surto de um vírus desconhecido que se espalha numa velocidade assustadora pelo planeta. Lançado em 2011, o drama é contado em “multitramas”, mostrando uma série de personagens que aparentemente não possuem nada em comum, mas que por algum motivo tiveram um encontro – sendo ele casual ou não -, onde acabaram contaminando outras pessoas ou sendo contaminados pela doença.
A história começa com a viagem da gerente de operações de marketing global Elizabeth Emhoff (Gwyneth Paltrow), para Hong Kong para a inauguração de uma nova fábrica. Ao voltar, Beth, já contaminada, faz escala em Chicago e se encontra um ex-namorado escondido e passa o vírus adiante. Ao chegar em casa, também transmite para o filho e ambos morrem em cerca de horas. Seu marido, Mitch Emhoff (Matt Damon), no entanto, é imune e busca proteger de todas as formas a filha do contágio. Para isso, acaba isolando a menina da sociedade.
Casos semelhantes começam a acontecer em diversas partes do mundo, e os cientistas mais renomados passam a pesquisar a relação entre eles. Sem entender o que é o vírus nem como tratá-lo, órgãos governamentais buscam manter em sigilo a pandemia que começa a se instalar.
Em meio à corrida contra o tempo, um personagem aparece e levanta outra discussão. O repórter investigativo freelancer Alan Krumwiede, interpretado por Jude Law, possui um blog chamado Truth Serum Now, onde escreve sobre indústria farmacêutica e manipulação midiática. Krumwiede busca auxílio do jornal impresso The Chronicle para realizar a pauta, mas é rejeitado. Com raiva, o repórter começa a divulgar em seu blog um remédio homeopático criado por ele que seria a cura para a doença. O acesso ao blog aumenta rapidamente, chegando a 12 milhões de visitantes.
Ao mesmo tempo, uma série de especialistas buscam encontrar uma vacina. O Dr. Ellis Cheever (Laurence Fishburne), do Centro para Controle e Prevenção de Doenças, envia a Dra. Erin Mears (Kate Winslet) à Minneapolis para isolar os infectados. Na Organização Mundial da Saúde, a doutora Leonora Orantes (Marion Cotillard) é enviada para Hong Kong, para descobrir a origem do vírus, onde é sequestrada por Sun Feng (Chin Han) que busca garantir que a sua comunidade será colocada no começo da lista para receber a vacina.
A trama também traz Ally Hextall (Jeniffer Ehle), pesquisadora do laboratório de segurança de nível 4 que consegue, após muitos testes, descobrir a vacina para a doença. Após 26 milhões de mortes, a produção da vacina para o vírus MEV-1 é autorizada. Eis que surge a pergunta: “Quem recebe primeiro?”
É nesse contexto que a discussão chega ao seu ápice, quando os interesses pessoais se sobrepõem aos públicos. Funcionários do governo, como por exemplo o Dr. Cheever, tinham avisado parentes e pessoas próximas sobre a pandemia. Além disso, em busca pela própria “salvação”, as pessoas tem despertados em si instintos selvagens de sobrevivência. Roubam, saqueiam mercados, casas vizinhas, matam para não morrer.Escolas, hospitais, comércios são fechados por causa da pandemia. Algo diferente da vida real?
Por mais que as autoridades tentassem ocultar a catástrofe apocalíptica advinda de um vírus tão poderoso, a mídia, representada de uma forma polêmica pelo blogueiro, levanta muitas perguntas. Até que ponto uma instituição é mais confiável do que um cidadão comum? Em tempos de crise, em quem acreditar?
Em uma das cenas, quando o repórter tenta entrevistar o Dr. Ian Sussman (Elliott Gould), um dos médicos que está estudando o vírus, ouve dele a seguinte frase: “bloggar não é escrever, é pichação com pontuação”. Mas, ao mesmo tempo, como dizer que restringir o acesso à informação é o correto? Como driblar o aumento estratosférico de blogs e sites de não-especialistas que ganham milhões de seguidores dia após dia?
No filme, o blogueiro lucra 4, 5 milhões com um remédio falso chamado Forsitia, é acusado de fraude, conspiração e homicídios, mas tem a fiança paga pelos próprios “seguidores”. Como não voltar a questionar a credibilidade da internet?
Em dias em que Zika Vírus ocupa a primeira página da editoria de saúde, a preocupação volta a ser latente. Basta lembrar de casos, como citado no filme, da gripe espanhola, em 1918, que matou 1% da população mundial. A AIDS, na década de 80, considerada pela OMS como epidemia. Até que ponto a ficção se confunde com a realidade?
O grande perigo na vida real, vai além do slogan do longa. “Não fale com ninguém, não toque em ninguém.” O desafio a ser superado é: “não confie em ninguém”.