Macabra família
- 2 de setembro de 2019
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- Thamires Mattos
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Meio século não é capaz de apagar o que Manson e seus discípulos fizeram pela busca da concretização de uma teoria conspiratória
Eduardo Arantes
Como tudo o que é primitivo, o medo fascina. Talvez essa frase consiga explicar por que, mesmo meio século depois do massacre realizado, a família Manson continue alimentando o imaginário e a curiosidade popular na criação de livros, filmes e séries. Entretanto, essa não é a única razão para tentar compreender os motivos desse hediondo crime: aquele banho de sangue acabou com a ilusão do verão do amor, e abriu caminho para o retrocesso dos costumes.
Morando num antigo set de filmes hollywoodianos, o rancho Spahn, Charles Manson era um músico excêntrico, viciado em LSD, carismático, emocionalmente desequilibrado e obcecado por fama e grandeza. Este combo explosivo permitiu que ele formasse ao seu redor um harém de mulheres entregues ao seu controle e inúmeros seguidores dispostos a realizar seus planos macabros. Seu desequilíbrio mental o levou a pensar que os Beatles traziam músicas sobre o apocalipse com a canção “Helter Skelter”, que foi associada ao crime cometido por seus seguidores.
Manson acreditava veementemente que haveria uma guerra racial entre negros e brancos, e os negros seriam os vencedores. Mesmo assim, ele e seu clã governariam o mundo. Embora a ideia parecesse ótima para os participantes da seita, meses se passaram e não havia de sinais de que a guerra ocorreria. Foi aí que o “messias” convenceu seus fiéis a incitarem a batalha, assassinando brancos ricos e influentes da cidade e incriminando grupos de resistência negra.
Foi assim que em 8 de agosto de 1969, num luxuoso condomínio no bairro de Beverly Hills, em Los Angeles, quatro membros entraram em uma mansão para executar a ordem de seu líder. Ali estavam a atriz Sharon Tate, grávida de oito meses, o diretor de cinema e marido de Sharon, Roman Polanski, junto a mais três amigos. Os seguidores de Manson não tiveram piedade: atiraram e esfaquearam as vítimas, e escreveram frases na parede com o sangue delas. Dois dias depois das mortes de Tate e Polanski, seus vizinhos, o casal de milionários Leno e Rosemary LaBianca também foram mortos. Alguns pesquisadores afirmam que uma das possíveis causas deste homicídio foi que a residência onde ocorreram os eventos pertencia a um antigo desafeto de Manson – o produtor musical Ferry Melcher, que recusou uma gravação. Passado algum tempo de investigação e perícia, Manson e seus “filhos” assassinos foram presos e condenados à pena de morte. Porém, a sentença foi mudada para prisão perpétua em 1972. Manson faleceu por “causas naturais” em 2017, após passar 46 anos na cadeia de Corcoran, na Califórnia.
O jornal que cobriu o caso com maior intensidade na época foi o New York Times. Devido à época em que ocorreram os crimes, não é possível encontrar trechos de matérias com muita facilidade no portal do periódico. Todavia, como neste ano completam-se 50 anos do massacre, o jornal norte-americano disponibilizou diversos conteúdos sobre o caso. Eles mostram o que aconteceu com as seguidoras presas de Manson, curiosidades, e até a história de vida do psicopata que assombrou os Estados Unidos.
O mais assustador ao abordarmos a família Manson é o quanto este caso alimenta as produções de Hollywood até os nossos dias. Diversos filmes foram baseados na matança, como, por exemplo, Os Estranhos. O mais recente filme do renomado diretor americano Quentin Tarantino, Era uma vez em… Hollywood, também faz parte da lista. O fato de os estúdios levarem um caso tão perplexo e chocante como uma forma de ganhar dinheiro é de uma irresponsabilidade e insensibilidade sem tamanho para com os parentes das vítimas e suspeitos envolvidos, assim como para a segurança do público.
Meio século não é capaz de apagar o que Manson e seus discípulos fizeram pela busca da concretização de uma teoria conspiratória. Tanto diretores de cinema como a mídia deveriam tratar o tema de maneira consciente e cuidadosa, e não romantizar um crime que marcou negativamente uma nação. O caso da família Manson é um trágico exemplo de mais uma das inúmeras histórias que revelam como o ser humano é capaz de qualquer loucura à fim de alcançar seus objetivos – coisa que tem sido perpetuada pela indústria midiática.