A influência da mídia x A dúvida dos indícios
- 23 de agosto de 2022
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Uma infância interrompida de forma trágica e o desenrolar de um julgamento fora do tribunal.
Camylla Silva
Era noite do dia 29 de março de 2008, quando Isabella de Oliveira Nardoni, uma garotinha de cinco anos, foi jogada de uma altura de seis andares no jardim do Edifício London, Zona Norte de São Paulo. No apartamento que pertencia ao seu pai, moravam além dele, sua esposa Anna Carolina Jatobá, madrasta da menina Isabella, e seus dois filhos de três e onze anos. A princípio, o pai de Isabella afirmou que teria ocorrido um assalto no apartamento e os assaltantes teriam cometido o assassinato, mas Alexandre Nardoni e Anna Carolina foram considerados culpados pelo júri popular no conselho de sentença, e condenados a pagar 31 e 26 anos de prisão.
A tragédia teve muita repercussão e os desdobramentos do caso tiveram alcances extraordinários, inclusive, internacionais. A cobertura e a presença excessiva das mídias em cada desenrolar das investigações policiais, levou a imprensa a ter acesso várias vezes a materiais sigilosos, como fontes para o processo criminal.
Alcance de audiência
Segundo dados de uma pesquisa feita no jornal Folha de São Paulo, o investimento das emissoras de televisão na cobertura do caso Nardoni foi muito alto. Como exemplo, a Rede Globo colocou 18 repórteres e 20 cinegrafistas em campo; a TV Record, colocou 30 repórteres e produtores, mas 20 deles foram cinegrafistas. A quantidade de jornalistas totalmente focados na cobertura resultou em um aumento de 46% na audiência dos principais telejornais brasileiros, como Brasil Urgente e na Band.
Na sondagem do caso, a pesquisa foi feita nos primeiros 15 dias depois do crime, e comparada com o mesmo período de 2007, um ano antes do caso. A reportagem que foi publicada na Folha de São Paulo também esclareceu que o caso Isabella ocupou 15 minutos e 20 segundos do noticiário em uma das edições do Jornal Nacional, o que representa 37% do telejornal mais assistido e mais importante do Brasil.
Impacto popular
Com a vasta exposição das informações, a morte da menina Isabella preencheu vários jornais, revistas brasileiras e espaço nos noticiários da TV em todo o mundo. Sendo assim, foi desencadeado na população o sentimento de revolta, dor, compaixão e clamor por justiça. “Eu nunca vi isso na minha vida. Inclusive as agressões aos advogados, essa movimentação popular, como se não houvesse outras ‘‘Isabellas’’, outros julgamentos e assassinatos”, disse o advogado criminalista Roberto Delmanto em entrevista ao jornal SPTV. Antes de qualquer liberação dos resultados da perícia, centenas de pessoas se juntaram na frente do Tribunal nos dias de julgamento com o propósito de demonstrar indignação, cercando o carro dos réus e vaiando-os.
Noticiar ou formar juízo de valor sobre os fatos?
Você já notou que o jornalismo não é muito diferente de um enredo de novela? Assistimos cada capítulo e o desenrolar da trama entre uma mocinha e o bandido. Mas sempre que ficamos interessados em saber qual é o fim da história e as consequências do vilão, ousamos em julgar se a decisão dada pelo autor da trama realmente foi justa.
Todos os dias assistimos vários assuntos sendo discutidos pelos meios de comunicação, desde o esporte à economia, política à cultura, corrupção ao sequestro e assuntos do nosso cotidiano. São relatos que diariamente se repetem, e a cada episódio surgem novas surpresas para nos atrair.
Os casos que são julgados pelo Tribunal impediram claramente sob a regra de que devia ter a convicção dos jurados, mas eles não são obrigados a motivar suas decisões, mesmo quando há uma sustentação da opinião pública, influenciada pela mídia. Visto que antes de qualquer coisa, o jurado é um cidadão e está inserido na sociedade, recebendo influências dos meios de comunicação.
O julgamento feito pela mídia antes mesmo dos jurados pode levar a tomar a decisão de qualquer pessoa com o apoio dos elementos totalmente diferentes da sequência de atos processuais. E com o avanço da tecnologia, a internet e a televisão se tornaram influência direta na vida da população, o que tornou de certa forma, jurada em casos com grande repercussão.
É perceptível a grande influência da mídia nas decisões dos jurados em um Tribunal do Júri, em fatos de grande movimentação e repercussão social como o dos Nardoni é uma situação distinta, na qual há um crime que uma criança é assassinada pelo pai e a madrasta, que são julgados antes mesmo de acontecer o julgamento. Portanto, isso acontece pelo fato de que o acesso à informação mudou a forma como visualizamos e consumimos as notícias transmitidas pelos meios de comunicação.
Diferente do passado, quando o alcance à informação era escasso, a mídia sem dúvidas reformula opiniões. Mas todo cuidado é pouco para não acusar quem antecipadamente não tem culpa. O que pode acontecer quando o indivíduo se baseia apenas em fatos que a televisão e a internet informam, para simplesmente “comercializar notícias” sem ao menos conhecer o caso.