
Através de nossos olhos (nem tanto) patriotas
- 5 de março de 2025
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- Theillyson Lima
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Entre elogios e críticas, o filme Ainda Estou Aqui se tornou um fenômeno midiático no Brasil.
Luiza Strapassan
De um lado, extremo orgulho, fanatismo e comemoração. Do outro, deboche, descaso e desinteresse. Ainda Estou Aqui, filme aclamado pela crítica desde o seu lançamento no dia 7 de novembro de 2024, se mostrou um divisor de águas para a cobertura nacional. Será mesmo que o país habitado por nacionalistas valoriza a própria cultura?
O longa é uma adaptação cinematográfica do livro escrito por Marcelo Rubens Paiva, que conta a história real de sua própria família durante a ditadura militar. A trama dirigida por Walter Salles, mesmo diretor de Central do Brasil, Cidade de Deus e outros sucessos nacionais, se desenvolve a partir do drama vivido por Eunice Paiva durante alguns anos da ausência forçada de seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva.
O filme foi premiado com o Oscar de Melhor Filme Internacional, além de diversas outras indicações, como o Globo de Ouro, Prêmio BAFTA de Cinema, e vários outros. Bateu a marca de 5 milhões de espectadores no Brasil, e além disso, esteve no top 1 das bilheterias em Portugal, Reino Unido e até mesmo nos Estados Unidos, país das grandes produções hollywoodianas.
Mídia controversa
Durante a análise de alguns veículos de informação que serão citados abaixo, foi possível notar um padrão em dois deles. Um título bem pensado e valorizador na capa, seguido de diversas colunas e matérias que tinham uma intenção bem diferente da ideia inicial. Não necessariamente na ordem dos positivos para negativos, mas sempre apresentando um certo choque bruto de opiniões.
Um dos veículos foi o Gazeta do Povo, jornal centenário paranaense conhecido por todo o Brasil. No dia 14 de novembro de 2024 foi publicado o texto com o título “Apesar de badalado pela mídia, “Ainda Estou Aqui” não vale a ida ao cinema”, apenas uma semana depois do lançamento, alegando a visão enviesada do filme. Esse pensamento foi ainda mais reforçado com a frase “no fim das contas, a única coisa que ainda está aqui é o viés ideológico falando mais alto do que qualquer outra coisa”, frase que serviu para “alfinetar” muitos por aí.
Porém, começamos a perceber certa controvérsia quando, no dia 31 de dezembro de 2024, o título “Ainda Estou Aqui deveria ser celebrado por esquerda e direita” apareceu na Gazeta, seguido por “Ainda Estou Aqui e a reflexão necessária sobre diálogo político” no dia 6 de janeiro de 2025, mostrando um forte contraste de opiniões.
O mesmo traço pode ser notado, apesar de em menor quantidade, no jornal Folha de São Paulo, segundo maior jornal em circulação no Brasil, que publicou no dia 9 de fevereiro de 2025 a matéria com o título “Ainda Estou Aqui é exibido em 700 salas dos EUA e passa dos US$ 2 milhões”, contando em detalhes como o longa teve as expectativas superadas e multiplicou seus espectadores entregando história e qualidade. Mas, pouco tempo depois, no dia 17 de fevereiro de 2025, o texto intitulado “Ainda Estou Aqui é mais sintoma de um cinema carente que grande arte”, levou os leitores do grande jornal a questionarem sobre o backstage do filme.
Fato é que independente do viés da Gazeta ou do Folha, sua escolha foi apresentar mais de uma visão sobre a repercussão do filme, mesmo que os textos se “enfrentem”. Pensamento diferente de outros veículos, como o jornal O Globo.
Direção única
O Globo ocupa a primeira posição da lista de veículos de informação que mais circulam no país, e ao digitar na barra de pesquisa do site do jornal “Ainda Estou Aqui”, os resultados são dezenas de notícias e colunas exaltando, desde a produção até os resultados, o filme.
Nem uma nota sequer traz outra perspectiva ou opinião sobre o longa, reafirmando o argumento de que nós já esperávamos que um filme que aborda a ditadura, lançado em um país onde muitos ainda negam a existência desse fato histórico, não seria 100% acolhido. Mas exibir apenas o lado positivo não acaba moldando o pensamento daqueles que consomem os produtos midiáticos desse e de outros jornais que foram para esse lado?
Com essa análise chego à conclusão de que apesar de ser preferível que os leitores decidam sua própria opinião e usem os conteúdos produzidos apenas como base, é impossível para quem os escreve ser 100% imparcial. Além do fato de que a posição e ideais escolhidos na linha editorial também dizem muito sobre os conteúdos publicados.