De olhos abertos
- 11 de março de 2020
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- Thamires Mattos
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Sábado, 21h30:
Abro o aplicativo da Netflix e percebo uma série curiosa: Love is Blind (“Casamento às Cegas”, mas, na tradução literal, “O amor é cego”). São solteiros e solteiras que se submetem à encontros em que – e você já deve ter adivinhado – não podem ver a outra pessoa envolvida.
Clico no play. Horas depois, estou imersa em um mundo de intrigas, gente ignorante falando besteira, romance, e, o mais importante: vergonha alheia. Ri muito. De realidade, esse reality tem pouco: ignorar a dimensão corpórea do ser humano me parece algo absurdo. Inclusive, isso seria tema para outro Canal da Imprensa. Cada coisa a seu tempo.
Domingo:
Acordo com dor de cabeça. Vou estudar. Faço uma ligação. Cozinho. Durmo mais um pouco. Vivo normalmente, sem dramas ou intrigas. A verdade é que nossas rotinas são tão cheias (ou vazias, em domingos) que não há espaço para os sentimentos explosivos mostrados em reality shows. É claro que amamos, sentimos raiva, nos entristecemos e ficamos com fome. A beleza da existência humana é sua complexidade: tudo isso pode coexistir em apenas um/a de nós; dentro de um relacionamento, também. Chego à conclusão lógica de que reality shows encapsulam muito pouco do que somos, e, ao mesmo tempo, mostram pontos essenciais da sociedade. Vemos racismo, sexismo e falta de noção nas ruas e nas telas. A diferença é a resposta externa a tais fenômenos. Enquanto “cancelamos” participantes de certos programas, na vida, eles/as são nossos/as vizinhos/as, parentes, amigos/as, professores/as. É impossível fugir do emaranhado de reações humanas.
Segunda-feira à quarta-feira:
De volta ao trabalho, começo a editorar a 182ª edição do Canal. Meus pensamentos de domingo se refletem, sem advertência, nos textos de nossos/as convidados/as. Te convido a refletir sobre a complexidade humana através de programas que são, em sua gênese, simples. O amor não é cego; a realidade, também não.
Boa leitura,
Thamires Mattos
Editora-chefe do Canal da Imprensa