Veja e o preconceito racial
- 30 de outubro de 2019
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- Thamires Mattos
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A revista traz inúmeras histórias de negros que venceram na vida e lutam contra pressupostos
Amanda Januário
O vereador Fernando Holiday destoa do pensamento promovido pelo movimento negro – o que tem trazido dores de cabeça. Embora não tenha crescido de modo privilegiado e teve que lutar contra diversos problemas enfrentados por quem é negro e pobre, não defende o sistema de cotas ou o Dia da Consciência Negra. Para ele, essas práticas reforçam o estereótipo do negro como inferior.
A Revista Veja narra o caso do vereador como alguém se vê preso e luta contra os paradigmas que destroem a liberdade de escolha e expressão, afinal,como negro, Holiday “deveria” se encaixar na forma pré-estabelecida ao invés de ser livre para defender aquilo que julga correto. Nesse caso, parece que as opiniões das pessoas brancas e negras entram em um acordo: Holiday deveria ser a favor das cotas, do dia da consciência negra e não pertencer à política de direita. A revista ainda descreve Fernando Holiday como alguém que supera as expectativas da sociedade, de forma negativa ou positiva. Afinal, quando se trata de defesa de padrões, há quem opte pela tradição e quem vá contra pressupostos estabelecidos. Se, na Veja, o vereador se encaixa no primeiro discurso, a história de Ruth de Souza – primeira atriz negra do Brasil – é um exemplo vívido do segundo.
Durante a adolescência, ela decidiu atuar. Até aí, nada fora do normal. No entanto, tudo mudou quando as pessoas em volta perceberam que lhe faltava algo importantíssimo para exercer a profissão: a pele branca. Poderíamos imaginar diversas histórias tristes sobre a carreira de Ruth: impedimento para fazer testes; falta de personagens; racismo explícito. Mesmo assim, a Veja escolhe seguir outro caminho: o de uma atriz resiliente e que não se deixou abalar. Em vida, Ruth recitava um trecho de um livro que a marcou na infância. “O livro dizia que o negro tinha cérebro atrofiado. Depois de ler aquilo, eu só queria tirar 10 para mostrar que não era assim”, lembra, em depoimento. Ruth empenhou-se e mostrou, através de uma carreira cheia de superação e êxito, que a cor de pele não quantifica intelecto.
Das 12 edições analisadas da Revista Veja, entre 3 de julho de 2019 à 29 de setembro de 2019, foi possível notar a frequência de assuntos ligados ao preconceito racial. Na maior parte das reportagens, o negro é mostrado em situações de conquista e empoderamento. São habilidosos e grandiosos – elogios que, por muitos, seriam reservados apenas a brancos. A linha editorial transparece uma tentativa de combater o preconceito racial. As matérias são escritas com linguagem que gera antipatia ao racismo. Entretanto, o que não se sabe ao certo é resultado dessas publicações. Será essas matérias quebram ou criam mais preconceito? Isso só o público fiel da Veja é capaz de responder.