
Um herói pra chamar de seu
- 15 de outubro de 2025
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- Theillyson Lima
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Os filmes de super-heróis inspiraram gerações, mas têm se transformado para continuar cumprindo esse papel e, ao mesmo tempo, sustentar o mercado.
Gabrielle Ramos
Falar sobre super-heróis é quase sempre um convite a lembrar da infância. Personagens como Thundercats, Power Rangers, Jovens Titãs, Quarteto Fantástico e X-Men marcaram a sessão de desenhos de várias gerações. Expressões icônicas, como “Para o alto e avante!”, ajudaram a construir um imaginário coletivo que tornou esse universo parte essencial do crescimento de muitos.
É inegável que, por muito tempo, esse universo foi vivenciado em maior medida pelo público masculino. No entanto, a realidade mudou. Hoje, os filmes e séries de super-heróis têm se consolidado como um entretenimento para todos, pois alcançam públicos diversos e cada vez mais amplos.
Coisa de nerd
No passado, os filmes de super-heróis eram vistos como algo exclusivo para os chamados “nerds”, pessoas associadas ao estereótipo do garoto inteligente de óculos, por exemplo. Essa ideia se sustentava, em parte, pelo hábito da leitura de gibis e pela forte paixão pelo tema. Apesar disso, quando se trata do universo cinematográfico, a realidade é diferente.
Isso acontece porque os filmes têm começo, meio e fim. Ou seja, ainda que façam parte de universos mais amplos, não é necessário conhecer todos os detalhes para aproveitar a história, basta se envolver com a narrativa principal. Esses elementos extras são valiosos e fazem diferença para os grandes fãs de universos como Marvel e DC, mas para o público em geral, não são determinantes para a compreensão da narrativa.
Exemplos disso são os filmes solos de super-heróis, geralmente os primeiros de sagas e trilogias, como Mulher-Maravilha (2017), da DC Comics. A produção apresenta a origem da heroína e dispensa qualquer conhecimento prévio para compreender a narrativa.
Outro exemplo é Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa (2021), que reuniu todas as versões do herói, interpretadas por Tobey Maguire, Andrew Garfield e Tom Holland. Para os fãs da franquia, ver os três dividindo a mesma tela foi um dos maiores marcos da trajetória deste super-herói, possível apenas após os eventos de Vingadores: Ultimato (2019) e a introdução do conceito de multiverso no Universo Marvel. Para quem não é fã e assistiu ao filme, o impacto emocional pode não ser o mesmo, mas ainda assim é possível compreender a narrativa sem dificuldade, já que a produção explica que aqueles personagens pertencem a realidades distintas.
Isso reforça a ideia de que, para assistir a um filme de super-herói, não é necessário ser um grande conhecedor do universo, basta acompanhar a trama, como em qualquer outra produção cinematográfica.
Um super-herói pra chamar de seu
Outro fator que torna esses filmes acessíveis a todos é o crescente caráter representativo dos super-heróis. Essa mudança não apenas ajuda a desmistificar preconceitos e combater estereótipos, como também atrai novos públicos para essas produções.
No início dos quadrinhos, conteúdo que deu origem à maioria dos filmes de hoje, os personagens eram, na maior parte das vezes, homens brancos e heterossexuais. Já as mulheres, quando apareciam, eram frequentemente sexualizadas, reflexo do fato de que a maior parte do público consumidor dessas histórias era masculina.
Hoje, muitos super-heróis que antes tinham pouco destaque nas HQs estão se tornando conhecidos pelo grande público por meio dos filmes e outras mídias. Além disso, essas adaptações têm buscado representar melhor a diversidade do público atual.
Após a morte do Steve Rogers, o famoso Capitão América, o herói Falcão assume seu manto. Agora, Sam Wilson, um personagem negro, passa a representar um dos títulos mais icônicos do universo Marvel. Já em Eternos (2021), também da Marvel, Phastos se torna o primeiro super-herói abertamente gay a aparecer nos filmes do estúdio. Na série Batwoman, da DC, após a saída da atriz Ruby Rose, a protagonista passou a ser interpretada por uma mulher negra.
Todos esses exemplos mostram como os filmes de super-heróis vêm adotando abordagens cada vez mais diversas. Kevin Feige, presidente da Marvel Studios, afirma que o estúdio está comprometido em ampliar a representatividade para refletir melhor o mundo atual. Afinal, quando se trata de salvar o mundo, todos querem ter a chance de se ver representados.
Além de abordar temas universais como amizade, coragem, responsabilidade, ética, dilemas sociais e o futuro da humanidade, essas narrativas também influenciam percepções fora do cinema, ao impactar a moda, a música, os memes e até debates sobre ciência e sociedade.
Querendo ou não, é um mercado
Quando se fala sobre o sucesso dos filmes de super-heróis, não dá para ignorar que muito gira em torno do dinheiro. Ou seja, para que esse gênero prospere no cinema, as produções não podem se destinar apenas ao público que é super fã. Caso contrário, não se sustentariam. Não alcançariam bilheterias globais de aproximadamente US$2,797 bilhões, como foi o caso de Vingadores: Ultimato (2019), o segundo filme mais assistido da história.
Os gibis realmente não são para todos. Mas, a partir do momento em que suas histórias migraram para o cinema, os enredos precisaram se adaptar para justificar e sustentar os enormes investimentos desse mercado. “Ultimato”, por exemplo, teve um orçamento estimado entre US$356 e 400 milhões, tornando-se um dos filmes mais caros da história do cinema. O lucro estimado para a Marvel foi de cerca de US$890 milhões, valor alcançado principalmente graças ao público que não era formado apenas por super fãs. Imagine o prejuízo se apenas os “nerds” precisassem gerar esse número.
Além disso, como já mencionado, o cinema influencia a percepção das pessoas. Isso faz com que outras áreas também lucrem com o universo dos super-heróis. Ao entrar em um shopping e visitar qualquer loja de departamento, é possível encontrar roupas, calçados e diversos produtos temáticos. Até linhas de maquiagem e alimentos são inspiradas nos filmes desses gêneros.
Então, não se surpreenda ao encontrar crianças, adolescentes, adultos e idosos, mesmo sem nunca ter assistido a Homem-Aranha, inspirados pela clássica frase do Tio Ben: com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. Afinal, super-heróis não são apenas sobre quadrinhos e filmes, mas sim sobre identificação.