Silêncio eleitoral: a desimportância de pequenas cidades para as eleições
- 16 de outubro de 2024
- comments
- Theillyson Lima
- Posted in Análises
- 0
Cerca de 214 cidades brasileiras tiveram apenas um candidato para a prefeitura nas eleições municipais deste ano.
Késia Grigoletto
Não é segredo pra ninguém que durante um debate eleitoral à prefeitura de São Paulo, promovido pela TV Cultura no dia 15 de setembro, o candidato José Luiz Datena (PSDB) deu uma cadeirada no candidato Pablo Marçal (PTRB). No segundo seguinte ao acontecimento, o corte do vídeo já havia viralizado de norte a sul do Brasil nas redes sociais.
O acesso à informação é um direito de qualquer cidadão e garanti-lo é um dever estatal. Em períodos eleitorais a informação é essencial para que as pessoas possam fazer suas escolhas de maneira clara e consciente . As capitais e grandes cidades brasileiras costumam ter uma cobertura mais completa e precisa. Contudo, um país não é formado somente por capitais ou grandes cidades.
O IBGE divulgou que o território nacional abrange cerca de 5.000 cidades pequenas, que são classificadas dessa maneira quando possuem menos de 50.000 habitantes. Em vista disso, alguns questionamentos se fazem necessários: como a cobertura desses lugares é feita e como os eleitores dessas regiões se informam sobre os candidatos?
Lagoa Salgada
A cidade de Lagoa Salgada, localizada no estado do Rio Grande do Norte, não tem um portal de notícias próprio e a cobertura de seu processo eleitoral não aconteceu de maneira eficiente.
O candidato eleito como prefeito da cidade, Canindé Justino, está sob judice, o que significa que sua candidatura está pendente de avaliação da justiça eleitoral. Isso aconteceu, porque o candidato foi condenado por improbidade administrativa e por ter tido suas contas reprovadas pelo tribunal de contas do estado.
Esses fatores só foram levantados depois que o candidato já havia sido eleito, nenhum portal de notícias levantou isso antes. Se a CNN ou o G1 tivessem publicado essas informações anteriormente, os eleitores poderiam ter tido mais clareza em quem estavam votando e talvez não ter elegido como prefeito alguém que corria riscos de não assumir.
Por conseguinte, a necessidade e um desgaste de uma nova eleição, que se não ocorrer em tempo hábil, fará consequentemente que o presidente da Câmara de Vereadores assuma como prefeito interino.
E o questionamento que fica é: isso é justo com o eleitor, ele votou em um candidato para que outra pessoa assumisse ?
Inhaúma
A cidade de Inhaúma, no estado de Minas Gerais, não teve uma cobertura completa e que abrangesse a necessidade de informações que os cidadãos tinham. Além dos sites de assessorias de cada candidato, o único canal que forneceu por meio de inteligência artificial o plano de governo de candidatos de todos os municípios foi o G1.
No entanto, apenas um plano de governo não comunica o suficiente para um cidadão escolher um candidato. Fatores como, o histórico de cargos públicos que o indivíduo já ocupou, valor do patrimônio que possui, processos em seu nome, são aspectos que não se podem desprezar para que se tome uma decisão coerente e transparente.
Contudo, informações como essas não são acessíveis para o eleitor da cidade de Inhaúma, porque, além de não haver um portal de notícias da cidade, os grandes veículos de comunicação desvalorizam o jornalismo regional, priorizando capitais e grandes cidades.
Porém, após a apuração dos votos, Inhaúma se tornou notícia nacional, pois os candidatos ao cargo de prefeito empataram, o que gerou muita curiosidade e questionamentos sobre como isso seria resolvido. A lei eleitoral define que em casos como esse, a prioridade é do candidato mais velho, ou seja, a pessoa de maior idade é considerada como eleita.
Diante desse contexto, uma reflexão se faz necessária: será que se Inhaúma não tivesse passado por essa situação, ela teria se tornado relevante? Não, caso isso não tivesse acontecido, a cidade jamais teria se tornado pauta de uma notícia nacional, pois uma cidade de 6.239 pessoas “não faz muita diferença” para um país de 215,3 milhões de habitantes
Oliveira de Fátima
A cidade de Oliveira de Fátima, no Tocantins, elegeu como prefeito Nereu Fontes. As informações que o G1 disponibiliza sobre o candidato, após o mesmo ter sido eleito são: solteiro, ensino médio completo, 47 anos, policial civil e que declarou o patrimônio em 263. 592,40 reais.
Somente esses dados não são suficientes para que um cidadão escolha o prefeito da sua cidade, ainda por cima quando são divulgadas após o período eleitoral. Quando fatos como esses acontecem, o único prejudicado é o eleitor.
O que Lagoa Salgada, Inhaúma e Oliveira de Fátima têm em comum é o descaso da imprensa. O jornalismo regional é quase inexistente em lugares como esses e tudo isso comunica que o eleitor não importa ou que existem cidades no Brasil que não são satisfatoriamente relevantes e que consequentemente as pessoas que ali vivem também não são.