Rede Globo e o caso Majú
- 13 de outubro de 2015
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- Thamires Mattos
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Racismo é questão de cor ou de classe social? Esta não é uma defesa à postura de que o racismo contra pessoas famosas é justificável. Obviamente, nenhum tipo de preconceito deveria ser aceito, ainda mais quando se tem uma legislação que ampara o agredido.
Luciana Ferreira
No mês de janeiro, a Lei 7.716, que define os crimes e as punições contra o preconceito racial, comemorou 26 “aninhos”. A lei, sancionada em 5 de janeiro de 1989, determina pena de reclusão àqueles que cometerem atos de discriminação ou preconceito de raça, etnia, religião, cor. Além da referida lei, outras políticas contra o preconceito racial foram criadas. O Estatuto da Igualdade Racial (2010) e a Lei de Cotas (2012), são exemplos. Todas com o objetivo de punir o crime racial. Entretanto, ou a sociedade não entendeu ainda o que é racismo e que o mesmo configura-se como crime ou talvez o poder judiciário não tenha dado a devida seriedade ao assunto.
A cada dia os meios de comunicação noticiam mais e mais casos de pessoas que, por terem a pele negra, sofrem retaliações nos diversos espaços sociais. Indivíduos que são ofendidos de forma pitoresca por seres que se acham superiores e que se consideram puramente brancos em um país tão mestiço como o Brasil. O racismo é uma realidade pulsante no Brasil, todavia, casos anônimos continuam esquecidos e o assunto volta com força total quando a vítima é uma figura de renome.
No mês de julho, ofensas racistas proferidas contra a jornalista Maria Júlia na página do facebook do Jornal Nacional causaram repúdio e indignação social. Os âncoras do programa tomaram as dores da profissional e saíram em defesa dela lançando a hashtag #SomosTodosMaju , que como um vírus alastrou por todas redes sociais. Várias mensagens de apoio à jornalista foram divulgadas. Até mesmo na edição do JN do dia 3 de julho, o apresentador William Bonner conversou ao vivo com a moça que expressou gratidão pelas mensagens de apoio recebidas e indiferença contras as agressões sofridas.
A emissora tomou a dianteira do caso, pressionando o Ministério Público para investigar o ocorrido e anunciando que internamente iria tomar as devidas providências. Em resposta ao ocorrido, o site de entretenimento da Folha de São Paulo , F5, também noticiou o caso mostrando que o assunto causara uma revolta na internet. Além disso, a folha indicou que a jornalista do Jornal Nacional tornar-se-ia pauta da edição de sexta-feira.
No dia 06 de julho o site publicou outra matéria utilizando o ocorrido com Majú para realizar um link com o livro do jornalista britânico Jon Ronson, onde ele registra casos de pessoas que cometeram algum deslize nas redes sociais e pagaram um alto preço por isso. Ou seja, o jornal aproveitou a questão do racismo para mostrar que a internet de certa forma também funciona como um tribunal capaz de alavancar ou até mesmo destruir carreiras.
O fato contra a Majú reascendeu a chama da revolta do povo brasileiro contra o racismo. A indignação tomou conta das redes sociais. O triste, no entanto, é que uma semana depois outros casos assumiram o cenário da mídia e o gigante novamente adormeceu. Como se o racismo no Brasil fosse algo isolado, não levando em conta que mais de 50% da população brasileira é negra e parda, segundo divulgou o senso do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A postura que a emissora Globo assumiu diante a questão foi aclamada por algumas pessoas, que consideram que o racismo precisa ser erradicado no Brasil. Todavia, o que pode causar certo incomodo é que todos os dias pessoas de classes mais baixa sofrem com o racismo, seja ele oculto ou escancarado, e o fato nem sequer chega às lentes da mídia, que dirá ao júri de um tribunal. Agora, se o preconceito atinge um jogador, um artista, jornalista ou qualquer celebridade o caso assume outra proporção. Infelizmente os “casos famosos”, ainda que sirvam ao propósito de chacoalhar a sociedade, ficam esquecidos, abafados, pouco depois por um comportamento alienador da mídia ligado a rotina de velocidade de seus espectadores.
Esta não é uma defesa à postura de que o racismo contra pessoas famosas é justificável. Obviamente, nenhum tipo de preconceito deveria ser aceito, ainda mais quando se tem uma legislação que ampara o agredido. Mas é curioso observar que ao passo que a mídia julga alguns fatos como importantes, age de forma negligente com a falta de respeito racial estendida a seu “Zé” e com a dona “Maria”, como se fosse algo de menor importância.
Além disso, qual a finalidade de toda aquela apoteose midiática, se depois o caso é abafado e o preconceito volta a perdurar como algo sem nenhum grau de seriedade? Ao que parece está na hora de a sociedade, e principalmente a mídia brasileira tomar o tema do racismo como uma cláusula pétrea e buscar soluções ao invés de audiência.