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Pequenos gigantes

  • 3 de setembro de 2025
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  • Theillyson Lima
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Entre promessas e pódios, a cobertura esportiva transforma crianças em ídolos adultos e esquece de mostrar o peso que atletas jovens carregam.

Kleber Paim

O sucesso de grandes atletas jovens tem se tornado cada vez mais recorrente. Olimpíadas, futebol, tênis, ginástica: não faltam exemplos de adolescentes que brilham como profissionais formados, com talento de sobra e, muitas vezes, maturidade de menos. Em comum, o encantamento do público, os contratos milionários, as hashtags de exaltação… e o silêncio constrangedor sobre o preço que se paga para crescer antes da hora.

Entre narrativas de “jóias raras” e “futuros brilhantes”, a mídia esportiva celebra, transmite, comercializa e endeusa esses nomes, mas raramente questiona o que significa, na prática, competir, vencer e falhar com 12, 14 ou 17 anos. Um erro, e tudo vem por água abaixo e não há tempo para ser criança quando o mundo te exige como um campeão.

Currículo olímpico, boletim do ensino médio

Lamine Yamal e Rayssa Leal são dois rostos, e corpos, dessa nova geração de ídolos juvenis. Yamal, espanhol, é hoje um dos principais nomes do Barcelona e da seleção nacional. Aos 17, já era titular em jogos decisivos, e em 2024, levantou sua primeira Eurocopa. É difícil não se impressionar com sua frieza em campo, a postura de veterano, a habilidade que desafia a idade. Mas é justamente aí que mora o perigo: é ele quem amadureceu cedo demais, ou somos nós que o estamos tratando como alguém que já cresceu?

Rayssa Leal, a Fadinha, é outro exemplo. Medalhista olímpica aos 12 anos, recordista de títulos e favorita ao ouro em Paris, ela parece ter vencido a corrida contra o tempo. Mas basta assistir às suas entrevistas ou observar a presença constante da mãe ao lado dela em competições para lembrar que Rayssa ainda é uma adolescente e que, no fundo, precisa ser protegida, não apenas promovida.

Em muitas competições, o acesso da mãe de Rayssa aos bastidores precisa ser negociado, autorizado ou, em alguns casos, negado. Isso já gerou situações desconfortáveis: enquanto treinadores e dirigentes adultos têm livre circulação, a presença da figura materna precisa de justificativa formal. Em Paris, por exemplo, houve dificuldades para que a mãe acompanhasse a filha nos treinos, o que levantou questionamentos sobre a estrutura dos torneios e a falta de preparo para lidar com atletas tão jovens.

Se Rayssa precisa cumprir regras de adulto, por que não pode ter o suporte emocional e familiar de alguém que ainda é, legal e psicologicamente, uma criança? A incoerência revela o despreparo das instituições esportivas e da própria mídia para lidar com o que elas mesmas ajudaram a construir: o fenômeno da adultização no esporte.

Transmissão em tempo real, amadurecimento em câmera lenta

A presença de atletas tão jovens em grandes competições levanta uma questão pouco explorada nas transmissões: qual é o papel da mídia na adultização desses esportistas? A cobertura exaustiva, os closes dramáticos, as análises táticas e a cobrança de desempenho tratam crianças como adultos de elite.

As transmissões exaltam conquistas precoces e muitas vezes repetem narrativas heroicas que não consideram a idade dos atletas. Quando uma adolescente entra em quadra, o foco da câmera, a trilha sonora e os comentários a transformam em protagonista de um épico, mesmo que o contexto real seja de vulnerabilidade emocional e formação pessoal em curso.

No caso de Rayssa, a própria estética da transmissão, com lentes lentas, planos fechados, replays de expressões faciais, muitas vezes a posiciona como um ícone da superação. Mas pouco se fala da exaustão, da pressão por repetir resultados, da perda de privacidade, dos contratos que se acumulam sobre sua mochila escolar.

Regra é regra? 

Muitos esportes possuem restrições etárias, no papel. O futebol, por exemplo, não permite contratos profissionais com menores de 16 anos. No entanto, jogadores como Endrick já estampavam capas de jornais, acumulavam seguidores e eram transferidos por milhões de euros antes mesmo da maioridade.

A exceção se torna regra quando há capital envolvido. Marcas disputam esses atletas mirins como ativos promissores. Clubes tratam os jovens como investimentos. A mídia se junta ao coro, produzindo reportagens que naturalizam a ideia de um “craque mirim” ser tratado como uma celebridade de 30 anos.

O sistema esportivo atual não está apenas permitindo a adultização: ele a fomenta. Desde o marketing até os bastidores das federações, tudo parece moldado para acelerar carreiras, mesmo que isso signifique sufocar infâncias.

Jornalismo que narra mas não questiona

A cobertura esportiva tem um poder imenso de formação de opinião. E quando se trata de jovens atletas, esse poder deveria ser exercido com mais responsabilidade. Poucos veículos fazem reportagens críticas sobre o impacto psicológico da fama precoce. Menos ainda investigam as estruturas de suporte emocional para esses atletas.

A mídia, quando quer, sabe proteger. Em casos de saúde mental de atletas adultos, como Simone Biles ou Naomi Osaka,  houve uma onda de apoio. Mas quando se trata de adolescentes, a empatia parece dar lugar à idolatria. Exige-se foco, maturidade, desempenho. Espera-se que o jovem dê entrevista no idioma do patrocinador e jogue como um profissional de elite. E quando não entrega, a decepção pública também é amplificada.

A narrativa jornalística precisa sair do lugar comum da promessa precoce. É preciso trazer vozes da psicologia, da pedagogia, da família. É preciso falar da criança, não só do prodígio.

Adultização não é só figurada 

O fenômeno da adultização no esporte é, acima de tudo, estrutural. Ele começa nas categorias de base, passa pelas redes sociais, é legitimado pela imprensa e se consolida nas decisões das instituições esportivas. E, no centro disso tudo, estão corpos infantis carregando responsabilidades adultas.

A monetização da infância atlética segue em ritmo acelerado. Cada pódio rende novos contratos. Cada aparição vira conteúdo. O que deveria ser uma etapa formativa vira produto vendável. E o que se perde nesse processo dificilmente é recuperado: tempo, identidade, infância.

Enquanto a sociedade continuar confundindo talento com maturidade, correremos o risco de transformar sonhos esportivos em traumas silenciosos. Não basta apenas torcer por jovens atletas, é preciso protegê-los, mesmo que isso signifique desacelerar o espetáculo.

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