Os Dez Mandamentos(2016): uma ideia não tão brilhante de adaptação
- 19 de abril de 2023
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- Theillyson Lima
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Má construção, atuação morna e uma produção caça-níquel fazem parte do longa.
Natália Goes
Cenários deslumbrantes, um Egito antigo. Uma adaptação que cobre mais de 100 anos de história. Uma produção novelística de 176 capítulos condensada em quase 2 horas de filme. Como poderia dar certo?
A discussão do longa-metragem não é sobre fé ou até mesmo sobre uma igreja e sim sobre uma adaptação de uma das histórias da Bíblia que ecoa até os tempos modernos e faz parte de uma cultura.
Enredo do filme Os Dez Mandamentos
O filme começa com a narração da história da libertação do povo de Israel, contada pelo personagem Josué, o sucessor na liderança do povo. As cenas mostram o nascimento do futuro líder de Israel, Moisés, em meio a uma época em que o Faraó mandou matar todos os bebês.
Nesse mesmo tempo, mostra também o nascimento do filho do faraó Ramsés. As cenas se passam e mostram a princesa, filha do rei achando o cesto com um bebe no rio, o mesmo cesto em que a mãe de Moisés o coloca para salvar a sua vida.
Miriã, irmã de Moisés, o observa e assim que a princesa o pega no colo ela oferece uma ama de leite para dar de comer ao menino. A princesa faz um acordo com a mãe do menino de cuidar e amamentar ele. Moisés é levado pela própria mãe que cuida dele e o amamenta.
Quando o menino está grande, ele volta ao palácio e aprende toda a cultura egípcia, além do ensino sobre guerras. As cenas mostram o crescimento de um menino que se tornou excelente em tudo que faz.
Mostra o futuro líder do povo de Israel descobrindo sua origem hebreia e sua curiosidade em saber sobre o povo hebreu e sua família. Ele encontra sua família, passa a ter contato com ela e a se compadecer do povo hebreu que estava sofrendo opressão pelo governo egípcio.
Em sua indignação, Moisés mata um egípcio que estava chicoteando um hebreu, com isso sua vida muda totalmente. Ele foge do Egito e começa sua jornada para salvar sua própria vida, até que ele chega em Midiã.
Nessa cidade, Moisés defende moças que estavam sendo perturbadas por pastores de ovelha e logo em seguida dá de beber ao rebanho de ovelhas das moças, em gratidão o pai das moças o convida para comer. Ao contar toda a história para o pai das moças, ele o convida para morar com eles e para trabalhar para ele, garantindo casa e comida.
É possível perceber que o homem que o abrigou possuía a mesma cultura que os hebreus e servia ao mesmo Deus. Com o passar das cenas, Moisés se casa com uma das filhas deste homem e vive uma vida simples de pastor de ovelhas.
Enquanto isso, o povo hebreu era cada vez mais oprimido pelos egípcios e clamava ao seu Deus pelo libertador prometido. Depois do clamor, em forma de sarça pegando fogo, o Deus dos hebreus aparece para Moisés e diz que o enviará para libertar o povo.
A partir de então, o personagem principal desenrola toda a história de libertação do povo hebreu, desde seu reencontro com as pessoas queridas, passando por todas as pragas até de fato a libertação do povo, tentando passar o que de fato está escrito no livro considerado sagrado.
Bíblia como livro sagrado
Uma pequena biblioteca de livros, a Bíblia é bastante conhecida no mundo. O livro, que contém 66 livros, é considerado sagrado pelos cristãos que acreditam que as palavras ali escritas foram inspiradas pelo seu Deus.
Sendo essas escrituras a revelação de Deus, os fiéis a essa escritura a estudam procurando verdades que alimentam a alma. A produção adaptada desse livro especial, confunde e até mesmo atrapalha o conhecimento verdadeiro ali exprimido.
Há alguns problemas em referência a seguir o que tem de fato escrito na Bíblia. Na cena em que Moisés matou um egipicio para livrar um hebreu, a Bíblia não relata que o hebreu era o seu irmão, Arão. Porém, no filme é Arão que é livrado das mãos do egípcio. O filme contém uma porção de cenas que não estão de acordo com o que está escrito.
Se a Bíblia é considerada um livro sagrado para muitas religiões, a adaptação do filme ou qualquer outra produção deveria seguir exatamente o que tem escrito? Os personagens, cenário e roteiros deveriam ser fiéis ao original?
Personagens, cenário e roteiro
O filme, que foi adaptado da novela Os Dez Mandamentos, produzida pela Record, tem muitos cortes onde a história fica sem contextualização e até mesmo um pouco confusa, mesmo com uma narração por trás para tentar contextualizar. A produção, que não foi feita para o cinema, tenta de alguma forma encaixar a história condensada.
Muitos personagens que não aparecem na Bíblia entram para participar da história, pois estavam na novela, mas se perdem no meio do caminho por conta dos cortes da adaptação da novela para o filme.
Em outros momentos, personagens que aparecem no livro sagrado, passam em branco sem peso algum. O relacionamento entre Moisés e Zípora é extremamente romantizado e acontece do nada.
Outro ponto importante que vale ressaltar é que a interpretação e composição dos personagens nas mídias de novela e cinema são diferentes. O ritmo de trabalho dos atores é diferente. Essa diferença se faz notar ao assistir a produção.
Em contrapartida, o cenário e o figurino do filme foi muito bem planejado, desde as roupas até mesmo os ambientes em que as cenas foram gravadas, remetendo o público a estarem em meio ao antigo Egito. Mas não dá para falar o mesmo da linguagem com gírias e da maquiagem dos atores.
Jeitinho Brasileiro
Enredo mal construído, explicações mal amarradas, uma atuação morna e até muitas vezes constrangedora. Apesar do ator Guilherme Winter dar o seu melhor no papel de Moisés, ele não consegue sozinho levar o filme nas costas.
O filme traz cenas desconexas com a história dos personagens principais, o que deixa toda a trama um pouco perdida na construção do roteiro. A adaptação mais parece uma colcha de retalhos, ou um videoclipe, do que realmente um filme bem produzido.
A liberdade poética distorce o conteúdo do produto original, a Bíblia. Isso dificulta a compreensão e traz confusão às pessoas que realmente querem aprender mais sobre o conteúdo escrito originalmente.
Se arte for fazer uma colcha de retalhos com imagens e um roteiro pobre, a Record está de parabéns. A produção não passa de uma forma de engordar os bolsos da emissora que há um bom tempo utiliza histórias da Bíblia como fonte de captação de público, sempre apelando para o bom e velho jeitinho brasileiro.