O preto no texto
- 13 de outubro de 2015
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- Thamires Mattos
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Embora o esforço de ações afirmativas para negros torne mais frequente a pauta do racismo na sociedade, a imprensa continua ignorando declarações preconceituosas propagadas nos grandes meios de comunicação
Cley Medeiros
Nos últimos anos o Brasil vem buscando avançar na diminuição da desigualdade racial com medidas de ações afirmativas, como o acesso da população negra à universidade, mas encontrou nos meios de comunicação forte resistência quanto à eficácia do que foi chamado de “cotas raciais”. Embora a mídia reconheça a dívida histórica com a população afro-brasileira e torne possível a exibição de programas que reconheçam as tradições afro, como o “Esquenta” da Globo, diversos programas continuam a prejudicar a compreensão mais abrangente da herança negra para a cultura e a formação do Brasil. Programas policias na televisão aberta, que denominam cerca de 45% da grade de programação de emissoras locais, associam o negro ao crime, e a negação da identidade para a população negra.
Vítimas do poder que representa a mídia desde a sua criação e a apropriação por parte das elites econômicas, as maiorias, consideradas minorias nos grandes meios de comunicação, continuam sendo estereotipadas por valores que sustentaram a ideia que possibilitou a existência da escravidão da população negra vinda da África, por exemplo.
O não reconhecimento da liberdade dos negros durante séculos, alienou a imprensa que constituiu, em suas narrativas jornalísticas, o tratamento desumano à população, até mesmo depois de alforriada. No Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, em 1850, era anunciado com frequência, a fuga de negros dos senhores de escravos, não como forma de crítica ao fato da existência da escravidão de uma cor de pele, mas sim para propagar as chances de ser encontrado o escravo fugido, para voltar a servir o senhor.
Desde então, a mídia tem se posicionado contra as medidas que promovem a abrangência na veiculação de programas e narrativas relacionadas a representação da cultura afro-brasileira. Políticas sociais também são constantemente criticadas, e o posicionamento oficial de diversos veículos de comunicação, como a Folha de São Paulo, é contra medidas de ação afirmativa e cita “cotas raciais”, como um dos exemplos.
A universalização da universidade nos últimos anos, como aponta os dados do Ministério da Educação, em 2010, possibilitou o salto de 9% para 43% de universitários negros nas instituições federais.
No entanto, nos espaços midiáticos a ênfase continua a ser dada a não compreensão das questões que levam as minorias à falta de tratamento igualitário nas narrativas jornalísticas. Declarações racistas são constantemente propagadas em programas de auditório, policiais, e até de entrevistas.
A culpa do meio
A TV Bandeirantes já teve que responder a justiça e sofreu duas medidas coercitivas. A filial na Bahia, foi condenada a pagar R$ 60 mil por violação aos direitos humanos durante uma transmissão da versão de Salvador do programa “Brasil Urgente”. Mirella Cunha, jornalista da emissora, humilhou Paulo Sérgio Soares, que é negro, e foi chamado diante das câmeras pela jornalista de “estuprador”. Embora nem julgado, ou provas tenham sido apresentadas contra Paulo. Durante a entrevista, a repórter chegou a rir do modo como o cidadão falava. A reportagem foi exibida em 2012.
O Ministério Público Federal propôs ação contra o grupo de Civita, da revista Veja<, em agosto de 2014, por conta da publicação da reportagem “A farra da antropologia oportunista”. O texto da revista Veja baseou-se em informações distorcidas e expressões injuriosas para criticar o processo de demarcação de reservas destinadas a grupos indígenas e quilombolas. A Revista pagou 1 milhão por danos morais aos povos tradicionais do estado de São Paulo.
A democratização dos meios de comunicação se torna uma das medidas eficazes para a propagação da diversidade cultural e racial do Brasil, tirando das hegemônicas declarações da imprensa atual, controlada por pequenos grupos e famílias, o poder no convencimento da agenda de debate no país, como o tema do racismo, e influências de outras “minorias”, ainda invisíveis nos textos dos jornais e programas da tv aberta.