K-pop: além do gênero musical
- 20 de setembro de 2023
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- Theillyson Lima
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Mais do que “música coreana” e estereótipos, o estilo fabrica ídolos e ultrapassa culturas.
Camylla Silva
BTS, BLACKPINK, EXO, BIGBANG e entre outros. O mundo da música nunca foi o mesmo desde que o K-pop surgiu da Coreia para conquistar os corações de milhões de pessoas em todo o mundo. Imagine uma batida irresistível, coreografias sincronizadas e um fandom apaixonado – essa é a essência do K-pop. Se você é ligado no que está em alta nas redes sociais ou no âmbito musical, você sabe do que eu estou falando.
Para contextualizar, o K-pop existe há décadas, mas nos últimos anos o fenômeno finalmente saiu do mercado de nicho e entrou nas conversas sobre a tão famosa música pop ocidental. Quando falo em K-pop, você pode até pensar naqueles grupos de dez membros com conceitos fofos e coreografias mais complexas, mas isso vai muito mais além do que você imagina. Calma, aos poucos você vai entender essa dimensão.
Por trás da música/mídia
A discussão começa com um equívoco de rotular o K-pop como um gênero musical. No entanto, essa é apenas a ponta do iceberg. Para a música ser considerada k-pop existe um conjunto de vários fatores. Ser um cantor e rapper dentro desse estilo não é apenas ser um artista, é se tornar um “idol”; um produto que segue um jeito específico de agir, de se vestir e dançar. Isso tudo além da aparência, que muitas vezes é moldada para se adequar aos padrões de beleza exigentes do setor.
Considere grupos como Bangtan Boys (BTS). Eles não apenas cantam e dançam, mas também participam de programas de entretenimento, atuam e até mesmo desfilam em passarelas. Uma abordagem multifacetada que passa despercebida, mas que faz parte do sucesso do K-pop.
Ser um idol significa se aproximar ao máximo da perfeição, exigindo anos de treinamento e conformidade com vários padrões estabelecidos pela indústria coreana. No entanto, o que muitas vezes não percebemos é que a indústria pop ocidental não é tão diferente quando se trata das demandas impostas aos cantores pop, especialmente aqueles direcionados ao público adolescente. O que muda a perspectiva coreana é a forma como são estruturadas.
Na Coreia, três grandes agências realizam audições e anos de treinamento de jovens. Eles seguem com a esperança de um dia entrar em um grupo e estrear no cenário do K-pop. Em outros casos, grupos são formados por meio de competições televisionadas, promovidas pelas próprias empresas. No entanto, assim como no ocidente, o K-pop também enfrenta críticas contundentes devido a contratos abusivos.
Isso inclui pagamentos reduzidos, já que uma parte significativa de seus ganhos deve ser destinada às empresas investidoras, agendas exaustivas que deixam pouco espaço para vida pessoal, dietas rigorosas e uma série de fatores que podem levar ao esgotamento dos idols. É importante analisar que essas questões estão começando a melhorar em certa medida, mas ainda há um longo caminho a percorrer para garantir condições de trabalho justas e saudáveis para os artistas do K-pop.
Frente à mídia:
Quando falamos de K-pop nas mídias, é possível falar com propriedade que eles entendem muito bem a importância das plataformas para se conectarem com fãs de todo o mundo. As redes sociais são usadas de forma criativa para interagir, lançar teasers de novas músicas e compartilhar momentos pessoais que humanizam os ídolos.
Grupos como BTS, por exemplo, dominaram as redes gerando hashtags virais e interações. Além disso, parcerias com marcas de moda e empresas de entretenimento abriram portas para exposição internacional, impulsionando ainda mais seu sucesso.
Por falar em estratégia, o vice-presidente de Marketing da Internacional Universal Music contou ao Harvard Business Review que os fãs de K-pop usam regularmente as redes sociais para dar feedbacks quanto às músicas e shows. Com a fidelidade da legião de fãs, as empresas não só aproveitam essa oportunidade, mas os incentivam fortemente. Uma das maneiras para certificar disso são as músicas disponibilizadas em fãs-clubes oficiais antes de serem lançadas para o público. Desta forma, os fãs podem decorar as músicas e cantá-las na estreia ao vivo.
Além disso, as empresas do K-pop são renomadas por adotar estratégias de marketing modernas, baseadas em quase 100% das redes sociais. Ao manter uma comunidade de fãs ativa nessas plataformas, a obtenção de feedback dos ouvintes ocorre de forma rápida, permitindo que a empresa ajuste o produto de acordo com as preferências dos fãs.
Mesmo com a pandemia de covid-19 em 2020, entre lives e eventos transmitidos pela internet, o K-pop continuou a ser um sucesso cultural mundial e se mostrou preparado para lidar com as dificuldades.
O BTS reuniu aproximadamente 993 mil fãs para o show virtual “Map of The Soul ON:E” e BLACKPINK reuniu 280 mil espectadores para sua primeira transmissão paga de “THE SHOW” no YouTube. Todo esse engajamento rendeu 6,7 bilhões de publicações no Twitter. A plataforma, atualmente nomeada como “X”, divulgou que o ritmo foi o assunto mais comentado pelos usuários ao decorrer de 2020 e ultrapassou seu próprio recorde alcançado em 2019, com 6,1 de menções.
Em 2023, BLACKPINK também fez história ao ganhar na categoria de “Group of the Year” no VMA. A vitória carrega um significado histórico, pois elas se tornaram a segunda banda exclusivamente feminina a receber o prêmio de Grupo do Ano.
Apesar do processo de seleção e do marketing bizarro, o sucesso do K-pop é inegável. Seu crescimento está ligado aos investimentos na formação e divulgação de bandas. O governo do país também está aproveitando a onda da moda coreana e fazendo uso intenso de grupos de K-pop para promover a imagem do país, promover o turismo e penetrar nos mercados internacionais com o Ministério da Cultura que tem um departamento exclusivo para o K-pop.
O futuro do gênero
O K-pop tem dentro do seu leque: rap, pop, rock, reggae e até alguns grupos que lembram de indie pop e indie rock. O gênero tem de tudo para todo mundo, afinal, a indústria quer vender para o máximo de pessoas possíveis. Portanto, o fator para o K-pop ter sucesso é seguir tendências.
Os grupos de K-pop não tem só uma música. Cada grupo de idol tem seu conceito podendo ser fixo ou variando a cada nova era. Anunciados no que chamamos de “comebacks”. A cada novo conceito, você tem vários materiais para se envolver na história, tais como clipes até as letras, conceitos e muitos outros. Mas a ideia dessa análise não é simplesmente pegar o hype do K-pop, mas é tentar apresentar para quem não conhece ou quem tem preconceito, algo dentro do pop pra você.
O gênero é sim um produto, assim como a música pop ocidental em si. Mas ser um produto não impede de ter uma boa música. Muitos dos grupos até escrevem e produzem as próprias músicas, ao contrário do que muitos pensam. Alguns idols fazem um trabalho dentro do seu grupo principal, mas também criam subgrupos com outros conceitos ou seguem em carreira solo paralelamente. Não tem como negar o espaço que o K-pop tomou na música ocidental nos últimos anos.
O sucesso vai além da febre do BTS. Cada vez mais músicos coreanos fazem colaborações com artistas ocidentais e se apresentam em festivais como o histórico Black Pink no Coachella. Ouvir K-pop não é se fechar para os problemas da indústria, sendo que é importante reconhecer suas falhas e abusos.
Para os críticos do mundo da música, é ironia apontarmos todos os erros como se fossem exclusivos da indústria coreana e não da indústria cultural mundial. Então o que explica um certo desprezo da internet por K-pop se não o preconceito? K-pop tem tudo para todos e por isso as pessoas se conectam com a música que consegue superar até mesmo a barreira da linguagem.
À medida que o K-pop continua a conquistar o mundo, o futuro do gênero parece promissor e desafiador ao mesmo tempo. O mercado global está mais aberto para artistas não-ocidentais do que nunca, e o K-pop abriu portas para esse movimento. No entanto, à medida que ele amadurece, há desafios a superar, como a pressão sobre os artistas e a capacidade contínua de atrair e cativar uma audiência diversificada mundialmente. Mas uma coisa é certa: o K-pop está aqui para ficar, continuando a redefinir a indústria da música e a cultura popular do mundo todo.