Imagem também é discurso
- 30 de novembro de 2015
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- Thamires Mattos
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Artiminhas midiáticas na manipulação de imagens para descontruir Dilma e a esquerda. Uma mescla de interesses da empresa sob a o título de imprensa.
Sudaleif Alves
A imagem pode ser usada como efetiva forma de controlar povos e reuni-los em favorde um poder. Isto quem diz não são leigos. O mais clássico de todos os exemplos da história é o caso da propaganda Nazista. Analisando as ações do partido de Hitler e suas artimanhas persuasivas jamais poderia-se negar o poder de imagens bem utilizadas para a consolidação e propagação dos ideais alemães. O mesmo se passou na antiga URSS.
Em tempos de guerra ou de paz, a imagem é poderosa ferramenta no convencimento social, na imposição ideologica. Celso Bodstein, jornalista, professor universitário e doutor em Multimeios pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita que o poder da imagem está em sua capacidade imediata de provocar efeitos, reações. “A fotografia, por exemplo, também como exaltação dos modelos néo-liberais através da publicidade e do incentivo ao consumo”, enfatiza. Bodstein, acrescenta que a fotografia permite acesso imediato a uma gama de memórias afetivas traumáticas, ontológicas, de historicidade e de desejos nossos. Uma imagem fala mais do que mil palavras? Neste sentido, sim.
Para o jornalista o efeito de convencimento, persuasão ou até identificação, não é atingido imediatamente pela linguagem escrita ou mesmo em casos de imagens em movimento, como no cinema. Estas formas requerem maneiras de absorção mais demoradas. Uma imagem parada é flecha que atinge rapidamente.
Ainda assim, não se pode definir uma fotografia como espelho da realidade. Bodstein é enfático ao afirmar que a imagem é sempre uma “distensão arbitrária da realidade. Elege elementos, enfatiza determinados aspectos e enfraquece outros. “O enquadramento, por exemplo, pode ser tido como elaboração ideológica, principalmente no campo do fotojornalismo”, ressalta.
Além do proprio processo subjetivo de elaboração, a fotografia sofre ressignificação quando exibida. Cada receptor, ao entrar em contato com a imagem, estabelece conexões, acessa suas redes de memórias e repertórios culturais. Este exercício promove um choque entre as pretensões do fotógrafo, por exemplo, e as do espectador. Neste sentido, imagem não é captura o real. ” Impossível à fotografia contemplar a plenitude da realidade, até por ser a realidade uma construção social em progresso”, complementa Bodstein.
Política, imagem e mídia
Para Luis Fernando Assunção, jornalista, professor universitário e doutor em Ciências da Comunicação com ênfase em processos jornalisticos, fotografia e texto estão envolvidos em uma relação de complementaridade. Não é demérito ao texto dizer que “ a imagem nos trouxe outras grandes possibilidades de falarmos de um assunto que o texto anteriormente não tinha e por isso o papel não-verbal da imagem, falando especificamente da fotografia, é tão importante na comunicação contemporânea”, acrescenta.
A imagem como ferramenta jornalística, tanto quanto o texto, está suscetível à manipulação. Se por um lado é possível, através das novas tecnologias, modificar uma fotografia sem que o leitor perceba a adulteração, a opinião pública se torna cada vez mais complexa de adestrar.
Na visão do consultor em Comunicação e Gestão de Imagem para organizações públicas e privadas, Edson Baffi, essa falsificação no campo político é ainda mais perigosa. “As pessoas estão cansadas de líderes pasteurizados, com discursos iguais e fiéis cumpridores de roteiros pré-estabelecidos”, menciona Baffi. Para ele, o que a figura pública é na intimidade de seu ambiente de trabalho, inevitavelmente, acaba sendo a mesma imagem percebida pela população.
Particularizando o conceito da construção da imagem à esfera política, é justamente porque uma imagem impacta tanto, que uma boa imagem é o maior bem que o agente público pode deter. É a marca construída por alguns anos que pode sofrer uma crise devido a uma ação orquestrada coletiva ou de um simples descuido pessoal. No caso da presidente Dilma Roussef, além dessas duas opções, a mídia teve papel atuante para a desconstrução de sua imagem. De acordo com Assunção, havia um plano claro especialmente dos grandes jornais e das revistas semanais para isso. Mas antes de discorrer sobre esta desconstrução, lembremos de alguns fatos que compuseram o processo de construção da imagem do governo Dilma.
Caso Dilma
Em 2010, a presidente foi apresentada como a única liderança capaz de dar continuidade ao legado social do então presidente Lula. “Naquele momento foi explorada exaustivamente a imagem de Dilma como ‘Gerente do Governo’, ‘Mãe do PAC’, a ministra escolhida por Lula para ser candidata à sua sucessão por ter inquestionável capacidade de gestão”, lembra Assunção. Ao mesmo tempo, Dilma era apresentada pela sua história de resistência aos anos de chumbo da ditadura militar, período em que ela foi presa e torturada.
Em janeiro de 2011, Dilma Rousseff terminou seu primeiro ano de governo com 59% de aprovação, o maior índice para um presidente neste período desde a redemocratização. Em março, a pesquisa do CNI/Ibope indicou 63% de aprovação do governo e, para a presidente, um recorde de popularidade de 77%. Após a queda de oito ministros em seu primeiro ano de mandato – sete deles envolvidos em denúncias de corrupção – a presidente ganhou a fama de promover uma “faxina ética” no governo. Naquele ano, de acordo com pesquisa do Datafolha, 72% dos entrevistados disseram que a presidente parecia “decidida” e 70% a consideravam “sincera”.
Março do ano seguinte, segundo o Ibope, a aprovação chegou a 79%. Muito mais do que as de Lula e de FHC no mesmo período de seus primeiros mandatos.
Queda
Não há qualquer pretensão de utilizar dados de pesquisa de aprovação como únicos medidores da popularidade da imagem dos governantes, porém, à época Dilma realmente desfrutava de uma onde de prestígio. É então que acontecem as manifestações populares de junho de 2013. Uma pesquisa divulgada pelo G1, realizada no dia 27 e 28 de junho com 4.717 pessoas em 196 municípios, mostrou uma queda de 27% na aprovação do governo pós protestos. Segundo a pesquisa, em um período de 20 dias, durante as manifestações, a taxa caiu mais de 1% por dia e destes 27%, 16% migraram para a avaliação de “ruim e péssimo”.
Apesar disso e de outras crises, Dilma se reelegeu em 2014 e terminou o mandato com 42% de aprovação. Mas a imagem da presidenta enfrentaria momentos piores. Logo depois da reeleição, 68% dos brasileiros que responderam as perguntas disseram acreditar em algum envolvimento de Dilma no esquema de corrupção da Petrobrás.
Dilma continuou desgastando sua imagem por fatores administrativos. Circundada pela crise econômica, hídrica e ameaça de crise energética motivada pela forte seca, problemas de infraestrutura, ajustes fiscais e de promessas revertidas – como o aumento das tarifas de energia- , a reprovação do governo Dilma aumentou para 62% em março de 2015, de acordo com o Datafolha. A pesquisa, realizada após novos protestos nas ruas contra a corrupção, indicou que o segundo mandato de Dilma teria a mais alta taxa de rejeição de um presidente desde setembro de 1992 – pouco antes do impeachment de Fernando Collor. O índice dos que consideram o governo bom ou ótimo caiu de 79% em março de 2013 para 10% em 2015.
Descontrução
A presidente que chegou a ter o maior índice de aprovação desde a redemocratização, enfrentava o desafio de recuperar uma imagem que passasse confiança a população. Em meio às crises, alguns veículos de comunicação aproveitaram-se para colocar Dilma nas manchetes com imagens que expressavam ódio e mau humor nas capa, mensagem fortalecida pelos títulos. Imagens de Dilma com as mãos no queixo, olhar cabisbaixo, testa franzida passavam aos leitores a postura de uma líder despreparada, insegura e rude.
E comprovando a intencionalidade de associar Dilma a esse perfil, o Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro estudou a cobertura editorial das eleições presidenciais de 2014. Focando-se nos três mais influentes jornais brasileiros – O Globo (RJ), O Estado de S. Paulo (SP) e Folha de S.Paulo (SP), a pesquisas concluiu que a mídia brasileira fez da presidente o “alvo” de um bombardeio contrário à reeleição. Em julho, foram 45 capa negativas contra Dilma, contra 13 de Aécio e duas de Eduardo Campos.
Uma das tentativas de recuperar a imagem da presidente (proposta por seus marqueteiros) foi a aparição de Dilma andando de bicicleta em um sábado de manhã. Em maio desse ano, nos arredores do Palácio da Alvorada, residência oficial, a presidente pedalou em trajes esportivos, capacete, óculos e acompanhada de seguranças. Dilma também chamou a atenção na época porque perdeu cerca de 15 quilos desde o fim da campanha eleitoral.
A cobertura midiática sobre a imagem do principal adversário na disputa a presidência- Aécio Neves- também colaborou para uma avaliação tendenciosa da imagem dele contraponto a de Dilma. Em alguns veículos, ele foi retratado com sorrisos abertos, disposto, dando a ideia de um político ágil, contemporâneo e preparado para desafios futuros. Um exemplo disto foi a capa da VEJA de 20 de outubro de 2010 que trouxe Aécio abrindo a camisa, uma posição de super-herói, com o botão “confirmar” no peito. Além do título de capa (“O poder de Aécio”) a edição trouxe uma reportagem de 8 páginas com intitulada “Aécio move a montanha”.
A imagem de desequilibrada e a esquerda
Baffi ressalta que ao mesmo tempo que os meios de comunicação tem a capacidade de alavancar de maneira meteórica a exposição positiva de uma determinada personalidade pública, eles também podem, numa fração de segundo, arruinar uma reputação construída no decorrer de muitos anos. “O agente político não precisa, necessariamente, cometer um grave erro moral de grande repercussão para que sua imagem seja abalada. As vezess apenas casuais equívocos”, explica.
Pior é quando esses equívocos são divulgados na internet. Rits de vídeos virais com trechos dos discursos de Dilma (Saudar a Mandioca, Mulher Sapiens, Chovendo em São Paulo, Mais Médicos e outros) tem propagado nas redes sociais a falta de credibilidade e preparo da presidente para ocupar o cargo. Na opinião de Assunção, esses vídeos dão a ideia de uma pessoa sem noção e desequilibrada.
Entretanto, os ataques da direita pela mídia não são apenas para afetar a presidente. A eleição de 2014 escancarou a velha disputa ideológica entre direita e esquerda. O ataque à imagem da Dilma é também à esquerda e a Lula. Assunção considera que com boas chances de vitória na próxima eleição, Lula se tornou o principal alvo para desconstruir a imagem do Partido dos Trabalhadores e da esquerda de uma maneira geral.
“A Folha costumeiramente rotula em suas manchetes obras do prefeito Haddad, como ‘a ciclovia do Haddad’ ou ‘os aumentos de Haddad’. Mas nunca li o mesmo jornal rotular o governador com ‘a crise hídrica de Alckmin’ ou ‘aumento de impostos de Alckmin'”, exemplifica. A tentativa de desconstruir a imagem de Dilma, da esquerda e a legitimidade de seus movimentos, revela que os setores mais conservadores enxergam o momento instável como uma oportunidade para inviabiliza-los. E alguns veículos de comunicação, têm sido o principal meio para atingir este objetivo.
Por interesse, tem se confundido o dever de informar como imprensa com o direito de ter interesses como empresa.