Ciência é Política
- 30 de setembro de 2019
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- Thamires Mattos
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Toda geração tem seu representante; qualquer mudança social precisa de um pôster. De Martinho Lutero a Al Gore – o grande divulgador do aquecimento global nos anos 2000 -, há uma constante: quem tem o poder de fala são homens adultos. Claro, existem exceções. Mas você consegue lembrar delas rapidamente? Pois é.
No entanto, os anos 2010 estão recheados de surpresas. Entre elas, está a voz do momento: uma menina de 16 anos, portatora de Asperger (transtorno que faz parte do espectro do autismo), que gosta de se vestir com roupas coloridas e fazer tranças em seus cabelos loiros. Ela decidiu, aos 15, fazer greve pelo clima, afinal, ninguém estava fazendo. Milhares compraram a ideia. Recentemente, Greta Thunberg – a garota em questão – discursou na Cúpula do Clima das Nações Unidas. Em uma fala carregada de fatos científicos e cobrança aos líderes mundiais, Greta expressou raiva. O descaso com o meio ambiente por parte de nações consideradas desenvolvidas, assim como aquele vindo do “país que mais protege o meio ambiente”, é acéfalo e decepcionante. Mas, enquanto a ativista ecoa que todos devem “escutar à Ciência”, sabemos que as coisas são mais complicadas.
Explico: a “Ciência” não é uma entidade independente. Ela não nasce na mente de acadêmicos malucos que financiam suas próprias ideias, quanto menos em um país como o Brasil. Ciência é feita através de dinheiro, e dinheiro só é conseguido por política – seja ela praticada com governos ou entidades privadas. Por isso, o cientista é tudo, menos independente. A obrigatoriedade de retorno válido à instituição provedora de recursos faz com que pesquisadores façam, das tripas, coração. E, para Estados e corporações que tem seus interesses fixos na extração de petróleo, agropecuária e/ou mão de obra barata/escrava, a Ciência não interessa em nada. Ela prova, cada vez mais, que essas atitudes em relação à produção e comércio não são vantajosas para a sociedade à longo prazo. Mas, para quem é dono do tabuleiro, reinventar regras é coisa fácil. Fingir que o outro jogador não existe – já que suas peças estão nos lugares certos – é, realmente, o movimento mais fácil a fazer. Então, ao escutar a Ciência, ouvimos, inevitavelmente, a balbúrdia da Política.
Os textos da 179ª edição do Canal da Imprensa expressam a indignação (em maior ou menor grau) da mídia brasileira com a Política que doma a Ciência; com governantes que não enxergam a destruição; com gente apática. E, nas palavras de Greta Thunberg: “A mudança está vindo, quer você queira, quer não”.
Boa leitura!
Thamires Mattos, editora-chefe do Canal da Imprensa