Campanhas: frias, calculistas e falhas
- 31 de maio de 2023
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- Theillyson Lima
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Seguir um planejamento à risca, quando se trata de campanhas, apresenta altos e baixos.
Lucas Pazzaglini
A primeira vista, uma campanha publicitária acolhedora, inclusiva, com uma música cativante como tema e banhada por sentimentalismo, pode fazer com que a empresa que a promoveu seja vista como a mais perfeita e dedicada. Mas, como Rita Lee bem aponta, não é possível confiar inteiramente em ninguém que passa a pose completa de “toda boazinha, toda do bem, toda da galera”.
A realidade é que as empresas promovem o que promovem porque sabem o público que tem, e compreendem as formas de alcance a ele. Não existe um erro nisso, mas demonstra tranquilamente o quanto podemos ser manipulados facilmente pelo que nos é apresentado. A ideia de que as campanhas são propostas por afinidade, paixão ou interesse em determinado tema pode ser verdadeira, mas, na maioria das vezes, o foco está no retorno monetário e não no impacto populacional.
Grandes empresas planejam tudo à risca e seguem o planejamento de forma fria e calculista, a fim de passar credibilidade, não se deixando levar pelos “hypes” que podem aparecer ao longo do caminho. Por isso, pautas como sustentabilidade, família e avanços tecnológicos, podem ser encontrados todo ano em novas campanhas publicitárias, porque esses temas sempre estão em alta. O problema desse sistema é que às vezes a empresa se perde no personagem e acaba criando situações em que não se encaixa, ou deixa passar oportunidades de divulgação indispensáveis.
(Auto)crise de imagem
Como já dito, a pauta de sustentabilidade é aproveitada por quase todos os setores de produção a cada ano, mas provando também que nem todos os temas em alta se enquadram a todos, surge a acusação de propaganda enganosa a três empresas automobilísticas.
No ano de 2017 a Fiat, General Motors e Ford foram intimadas pelo Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar), sob a acusação de propaganda falsa com apelo sustentável. As campanhas de marketing das três empresas na época traziam promessas de sustentabilidade, que não eram cumpridas pelos seus produtos.
Entre algumas das promessas apresentadas nas peças publicitárias estavam a diminuição de poluentes, baixo consumo de combustível e alta durabilidade, e cada uma delas foi refutada. O interesse dessas empresas em realizar campanhas em favor da sustentabilidade é muitas vezes acusado de “greenwashing”.
Segundo o portal Vertical Garden esse termo é “utilizado para instituições privadas, governamentais ou não-governamentais, que utilizam técnicas de marketing para estabelecer uma percepção enganosa de apoio ao meio ambiente”.
Outro exemplo, também de uma montadora, é mais recente. Ainda no ano passado a Mercedes-Benz iniciou uma campanha intitulada “‘Nature or Nothing’—the New Electric Vehicle Generation—it’s already here” (Natureza ou Nada’ – a Nova Geração de Veículos Elétricos – já está aqui), a frase vinha estampada em pôsteres que destacavam a marca da empresa, tendo como plano de fundo imagens de belezas naturais.
O problema é que a campanha foi lançada pouco tempo depois da empresa dona da Mercedes, Daimler, ter sido acusada de não baixar seus níveis de emissões de dióxido de carbono. Que tipo de credibilidade e coerência uma campanha como essa vai passar após tamanho escândalo? Exato, nenhum.
Como forma de repúdio, à plataforma Wherefrom acusou a empresa de greenwashing e promoveu seus próprios pôsteres, colocando o logo da Mercedes em imagens como seca e manchas de óleo, reiterando que essa representação é mais realista de como a empresa tem “contribuído” para o meio ambiente.
A fim de ganhar o apoio popular, as organizações acabam inventando mentiras disfarçadas de verdade, e promovem sua própria crise. Nem todas as campanhas são para todos, o que deve ser considerado durante um primeiro planejamento.
Oportunidade perdidas
A estática do planejamento promove maior credibilidade a empresa, porque ele vai se guiar apenas nos valores da instituição, mas ele também pode deixar a desejar, caso a equipe responsável por essas ideias não esteja atenta ao que acontece no mundo.
Existem datas e momentos que são destacadas e entram na agenda desde o primeiro planejamento, como o caso do outubro rosa ou do setembro amarelo. As duas campanhas merecem destaque e atenção, mas se prender a esses discursos pode não ser favorável à empresa sempre.
Por exemplo, se uma empresa está em meio a campanha do outubro rosa, mas um caso de racismo ganha destaque, e os valores da empresa também estão ligados a esse tipo de situação, se a preocupação maior da organização for o comprometimento com o planejamento não haverá nenhum movimento se preocupando com o problema que surgiu posteriormente.
Isso pode gerar ainda mais acusações de hipocrisia contra a empresa, porque se na linha editorial é proposta a defesa de certas pautas, mas quando é a hora de colocar em prática nenhuma ação é tomada, a desconfiança toma conta e a empresa fica desacreditada
Campanhas e Ações
Caso a empresa opte por seguir um planejamento inflexível do começo ao fim, deve estar atenta aos riscos que ele pode oferecer, conhecer a fundo seus valores e seu impacto, a fim de evitar complicações como as vistas acima. As campanhas sempre são criadas para promover a empresa, então quando ela segue para o outro lado, alguém cometeu um erro muito grande ao estudar a proposta.
Mas existem meios de assegurar que uma campanha seja levada a sério. Quando ações são criadas para acompanhar a proposta da publicidade é mais fácil a transmissão de credibilidade e ideais. Esse tipo de proposta funciona perfeitamente no modelo de planejamento, porque é necessário um estudo antecipado para que ela funcione.
Os casos das empresas automobilísticas poderiam ter sido evitados caso as ações tivessem sido implantadas juntamente com as campanhas. Justamente porque quando um problema balança a empresa, não são campanhas que devem ser criadas, mas sim ações.
Hoje o público está muito mais preocupado com o que a empresa representa do que com o que ela vende. É preciso mostrar credibilidade em todos os pontos. O planejamento certo pode oferecer isso, mas é necessário estar atento aos riscos, e saber quando ceder.