Achou que não ia ter Choque de Cultura no Canal? Achou errado!
- 20 de maio de 2019
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- Thamires Mattos
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Por trás da fachada de crítica de cinema, está uma análise social coberta de humor
Kevin Dantas
Imagine que alguém chega para você e te indica assistir um programa onde quatro motoboys irão falar sobre música clássica. É fácil acreditar que esse pode ser um programa interessante? Essa é a sensação que tive quando me falaram do “Choque de Cultura”. Quando assisti, logo virei fã. Vi todos os vídeos, entrevistas, e fiz todos os testes do Buzzfeed relacionados à nova sensação do YouTube. Por isso, decidi pesquisar um pouco mais sobre o programa: como os personagens foram criados? Quais as nuances (não, não estou inventando palavras) apresentadas?
O “Choque de Cultura” é composto por quatro personagens: Rogerinho da Van (importado do “O Ultimo Programa do Mundo”), Maurílio dos Anjos (o especialista, mais conhecido como “Palestrinha”), Julinho da Van (vulgo piloto mais sexy do transporte alternativo do país) e Renan (merecedor do prêmio “Pai do Ano”, #sqn). Cada um deles tem personalidades muito definidas. Os personagens são interpretados por Caito Mainier, Raul Chequer, Leandro Ramos e Daniel Furlan, respectivamente.
As personalidades apresentadas já começam como uma crítica mostrando quem é o “brasileiro comum”: ele está mais preocupado em criticar do que em conhecer a fundo o tema abordado. O mais próximo da indústria cinematográfica no grupo é Maurílio, que faz transporte para atores.
Ao mesmo tempo, o programa critica a criação de estereótipos em relação a certos profissionais. Choque de Cultura deixa claro que motoristas de van não são uma classe homogênea nem mesmo em suas representações. Rogerinho é o cara autoritário, que sempre sonhou em ter o próprio programa e vai proteger isso com unhas e dentes. Já Maurílio é o pseudointelectual que está constantemente magoado, já que seus comentários não são devidamente “aproveitados”. Julinho é cheio de contatos – o típico “malandro”, que sempre tem uma resposta pronta. O Renan é aquele chato que está sempre querendo ter a razão. Com isso, eles dividem entre quatro personagens as clássicas características do brasileiro leigo.
Um ponto a observar é o nome do programa, “Choque de Cultura”. O termo foi apresentado pela primeira vez em 1954 pelo sociólogo e economista Kalervo Oberg. Um choque de cultura é fruto de ansiedades e esforços que aparecem a partir do contato com uma nova cultura. Quando ficamos sem regras sociais com as quais estávamos previamente acostumados, experimentamos sentimentos de confusão, impotência e perda. Esse fenômeno se desenvolve em quatro etapas: Lua de Mel, Crise, Ajuste e Adaptação. As quatro fases são apresentadas de maneira muito sutil durante os episódios, através de Maurílio.
É importante lembrar também do conceito de humor de bordão. Nele, a piada é feita para chegar em seu ápice com um bordão, repetido para criar uma identificação. Já no “Choque de Cultura”, o bordão vem como abertura da piada e não seu fim. Por isso, não se encaixa na categoria que abarca diversos programas humorísticos populares, principalmente na televisão.
Os atores por trás dos personagens são igualmente relevantes para a construção do programa. Eles têm personalidades e pensamentos muito diferentes dos “pilotos”. Sempre que perguntados sobre o Choque e o que querem passar, deixam bem claro que se trata de um programa de comédia e não um programa de crítica de cinema. Se há alguma crítica, é a social, feita através do humor. Choque de Cultura apresenta numa linguagem completamente brasileira, de uma vez só: humor, crítica social, cinema e sociologia.