Intolerância: o ópio dos povos
- 5 de setembro de 2015
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- Thamires Mattos
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A edição desta quinzena, nossa primeira edição neste semestre, é assunto que me levou a profundas reflexões. Vivemos em um país pretensamente religioso. Um número expressivo de católicos (na maioria não praticante) e um grande contingente voltado ao protestantismo. Nos últimos tempos, uma parcela cada vez maior se rende à religiões de origem africana. Realmente somos pessoas de ideias miscigenadas e abertas a visões diversas? Acreditamos, verdadeiramente, no princípio da liberdade religiosa? Como a mídia aborda a temática? De forma aberta ou com cartas marcadas?
Os textos de nossos articulistas demonstram que não somos tão livres assim, no pensamento. Ao contrário, nossas abordagens, como imprensa, se voltam sempre a posturas debochadas, intransigentes, limitantes. Uma intransigência fundada em interesses, obviamente. Se ligado à política, o tema é tratado até com certa relevância. Em casos diferentes, o assunto é pauta para radicalismos e deboche. Principalmente a rótulos. Muçulmanos são terroristas; protestantes são fanáticos, prosaicos e burros; católicos são mediocres que se isentam de posições críticas.
O discurso da liberdade de expressão e pensamento se torna tão irônico que faltam-me palavras para posicionar-me. A pluralidade de vozes, no que concerne a religião, é ostensivamente desconsiderada. E quem ouse se manifestar neste sentido é colocado em descrédito. Parece que passamos de um estágio extremo a outro ponto, ainda mais extremo. Se na Idade Média as pessoas vivam confinadas a estereótipos e dogmas limitantes, hoje estamos presos a estereótipos e concepções igualmente limitantes, ou mais. Nos falta a sensatez para analisar tudo com olhos livres de preconceitos.
No séc. XIX, Marx afirmou que a religião era o ópio dos povos. Capaz de submeter, alienar, embrutecer, limitar. Algo que excitava, elevava os sentidos, mas não com verdadeiros fins de reflexão, crescimento. Ao contrário, como uma droga emburrecedora, produtora de confusão mental. Nos forçando (emocionalmente) a viver sob padrões irreiais. Creio que o verdadeiro ópio dos povos é a intolerância. A intolerância nos embrutece, limita, nos aliena. Cria e nos submete a concepções enganosas e extremistas. Nos confina a universos muito restritos de discussão sendo incapaz de permitir reflexão e crescimento. Nossa intolerância nos faz protagonistas do “evangelho do caos”. O discurso de intolerância, disseminado pela mídia, nos coloca sob o alvo de atitudes tão intolerântes e extremistas quanto. De que outro modo caracterizar o caso “Charlie Hebdo”?
Estamos completamente dopados pela intransigência dos discursos e estereótipos. Eis, o ópio dos povos!
por Andreia Moura
Editora-chefe do Canal da Imprensa