A ditadura da beleza

O Brasil é o país número 1 no ranking de procedimentos estéticos e cirurgias plásticas.

O mercado da estética foi responsável por movimentar 45 bilhões de reais no Brasil em 2018, de acordo com a Euromonitor International. No cenário atual e principalmente com a exposição das redes sociais, a estética de uma mulher fala muito sobre quem ela é, o rosto de uma mulher é a sua maior vitrine. Apesar de um tanto quanto machista, uma das maiores verdades do universo feminino é que, a aparência de uma mulher muitas vezes determina em que lugar ela vai chegar. 

Dado esse contexto, é quase impossível ser mulher e não ter uma rotina constante relacionada com skincare e maquiagem. Inclusive, venerada poderia ser a mulher que não se rendeu minimamente a tais rotinas. Diante de toda essa realidade, surgem algumas figuras no Brasil que se destacam, entre elas estão: Franciny Ehlke, Bruna Tavares, Mariana Saad, Mari Maria, Nina Secrets, Bianca Andrade e Virginia Fonseca. Esse texto pretende buscar entender, mesmo que de forma mínima, qual é a importância e o papel de pelo menos três dessas figuras no mercado nacional da beleza. 

Fran by Franciny Ehlke

Para escrever esse texto, me propus a acompanhar algumas dessas blogueiras por cinco ou sete dias e a Fran foi uma das que escolhi. Acho que de todos os personagens que já precisei acompanhar na internet, ela foi disparadamente o mais difícil. A Fran é a perfeita tradução de um ser humano fútil e inútil, porque a cada cinco stories, quatro estão relacionados a algo sobre  consumo. Além disso, a maneira como ela se porta com o público é no mínimo irritante porque denota algo muito forçado com ausência de naturalidade.   

A Fran é curitibana e faz parte das blogueiras que precisaram migrar do YouTube para o Instagram. O lançamento da sua marca aconteceu em 2021 e atualmente é uma das marcas de maquiagem nacional que mais faturam. A promoção da marca acontece de forma massiva no instagram e é bem feita. O marketing apesar de constante, é sútil muitas vezes e além disso, ela mostra o processo de produção do produto e faz com que o seguidor se sinta parte e realmente importante para ela e para a marca. 

No entanto, há uma controvérsia que pode deixar uma pulga atrás da orelha. A Fran faz muita propaganda da Lancôme no perfil dela, o que é capaz de gerar alguns questionamentos como: será que na vida real ela usa os produtos dela o tanto que ela mostra usar nas redes sociais? Se a marca dela é tão boa assim, por qual razão no casamento dela, a lembrança para os convidados foi um kit da Lancôme e não da sua própria marca? 

A narrativa da Fran e de sua marca conta a história de uma mulher real, que é “gente como a gente”. Ela não vende uma base ou um gloss, ela vende sua própria história, sua própria figura e um estilo de vida que qualquer pessoa sonha em ter e tudo isso faz com que não exista uma clara diferença entre a mulher e a marca. Isso torna o consumo quase impossível de não acontecer. Esse contexto tira a beleza do lugar de mera aparência e a põe em um papel performático e que precisa acontecer para uma mulher se dar bem na vida. 

Boca Rosa

A Bianca carrega uma história realmente impressionante. Lembro-me de assistir os vídeos dela no YouTube, ainda quando adolescente. Na época, ela já carregava o nome “Boca Rosa” e gravava em um quarto pequeno com as paredes lilases, na casa em que morava na favela da Maré, no Rio de Janeiro. Ela é símbolo de que, quem persiste e insiste sempre alcança. Em 2018,  lançou a marca “Boca Rosa”, o que a colocou como uma das marcas mais vendidas do Brasil. 

O marketing da Bianca é bem feito e ela pode dar uma bela aula de publicidade porque ela possui lugar de fala. O aniversário dela desse ano tinha como tema a marca dela, ela deu um kit de maquiagem para todos os convidados e até os guardanapos tinham o logo da marca. Outro diferencial da blogueira é que ela não nega suas origens e transmite uma vida mais real e o quanto ela trabalhou e trabalha para estar no lugar que ocupa hoje. 

No entanto, ao longo dos anos ela transformou sua identidade e isso claramente teve um reflexo na marca. Durante muito tempo a Bianca transmitia para o público uma menina extrovertida, doce e meiga, mas há alguns anos ela optou por se tornar uma figura mais altiva, empoderada, dona do próprio destino, e foi justamente durante esse processo que a marca passou por uma repaginada e se tornou mais clean e minimalista. 

Essas mudanças não refletem apenas na postura ou no posicionamento de marca, mas na estética da face de Bianca. A blogueira sempre foi uma moça com traços naturais bonitos mas, ao longo dos anos ela foi se desfigurando com tantos procedimentos estéticos, o que fez com que ela perdesse a aparência de naturalidade. Os lábios dela triplicaram de tamanho, as bochechas estão bem mais fundas, o rosto bem esticado, seguindo um padrão estipulado pela sociedade que apesar de padrão não é necessariamente o mais bonito e o mais atingível para a sociedade de forma geral. 

Linha Bruna Tavares

A jornalista Bruna Tavares começou sua carreira em 2009 com o blog “Pausas para feminices”. Em 2016 ela fundou a sua marca e em 2018, a BT se tornou a primeira marca nacional com a presença completa nos displays da Sephora. Diferentemente das outras, existe uma diferença entre a pessoa Bruna Tavares e a marca.  

A Bruna é presente e ativa em sua conta pessoal no Instagram,  e o seu canal de bate papo na rede não para, ela interage muito com os seguidores e faz um trabalho excelente fidelizando o público, tanto é que de todas as blogueiras da área ela é a que tem menos seguidores, entretanto, a conta de sua marca possui praticamente a mesma quantidade de seguidores das marcas de quem possui mais seguidores do que ela nas contas pessoais. 

Além disso, Bruna mostra uma interação mais ativa com o público e sem a imposição da compra constante. A estética dos produtos também é um fato interessante porque remete às princesas e aos contos de fadas que toda menina já sonhou em viver. 

Estética, consumo e beleza

A estética não permite uma pausa, um rosto com espinhas e um nariz com cravos não possuem um lugar. A maquiagem precisa estar presente constantemente a ponto de que essa rotina se torne conteúdo. A beleza que antes era configurada por diferentes formatos e padrões, se tornou ditadora do consumo cronometrado.

O que se vende não é apenas um produto, mas a mulher que você é. São inúmeras as campanhas que promovem a aceitação, contudo, na busca constante de um rosto perfeitamente esculpido, afinado, com uma pele totalmente uniforme, livre de qualquer defeito. Muito se discute sobre autenticidade, mas a realidade se faz bem longe do conceito. 

Todas essas figuras são mulheres que conquistaram um lugar, que sempre foi dominado pelas grandes corporações, mas que de certa forma só cresceram porque se renderam e se tornaram parte da lógica do sistema, de que o consumo se faz necessário para o amor próprio. E tudo isso é o encenar de um ciclo que toma proporções cada vez maiores e que só possui um início.

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