Reestruturação pós enchentes no RS: uma briga de opiniões
- 5 de junho de 2024
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- Theillyson Lima
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Muitos discutem sobre o que é melhor fazer, quando pouco é feito.
Gabrielle Ramos
As enchentes no Rio Grande do Sul (RS), causadas pelo aumento do nível do Guaíba e pelo intenso volume de chuvas, afetaram praticamente todo o estado. Diante dessa tragédia, a cobertura jornalística se intensificou ao analisar diversas questões, principalmente no que diz respeito à reestruturação do estado.
Para compreender quais são as medidas de reestruturação pós enchentes no Rio Grande do Sul, foram analisados conteúdos publicados em diversos portais de notícias. Dentre eles: g1, UOL, Folha de São Paulo, BBC News Brasil, Agência Brasil e outros.
Reconstrução
Entre os inúmeros problemas causados pelas enchentes, a perda de imóveis é um dos mais significativos. Embora algumas casas ainda estejam de pé, muitos itens estão total ou parcialmente danificados. Segundo estimativa do prefeito Sebastião Melo, de Porto Alegre, em entrevista ao programa Bom Dia Rio Grande, na RBS TV, cerca de 20 mil pessoas estão desabrigadas na capital do estado.
Nesse contexto, surge a necessidade da construção de residências para abrigar as pessoas afetadas. Entretanto, como construir novas casas leva tempo, o governo planeja erguer “cidades provisórias”, conforme anunciado pelo vice-governador do Rio Grande do Sul, Gabriel Souza. Apesar da iniciativa ser interessante, ainda não há data prevista para os desabrigados se instalarem nessas “cidades”.
Outra medida governamental é o Vale Reconstrução, um pagamento único de R$ 5.100 para as famílias que perderam seus bens na catástrofe, anunciado pelo presidente Lula. Adicionalmente, o Plano Rio Grande será implementado, que inclui a criação de um fundo dedicado à reestruturação, com o objetivo de centralizar os recursos e assegurar uma gestão transparente e eficiente dos fundos alocados.
A princípio, o foco desse fundo será nas medidas de curto prazo, com soluções para áreas como assistência social, segurança e serviços públicos. No entanto, estes não são os únicos problemas da região. Também é necessário reconstruir hospitais e escolas no Rio Grande do Sul. Além disso, rodovias e estradas, que segundo especialistas ouvidos pela Folha, devem ser uma prioridade. Apesar disso, o governo afirmou que estas medidas serão realizadas posteriormente.
Outro aspecto são as obras preventivas para evitar futuros desastres. Segundo especialistas entrevistados pela Folha, o processo de reconstrução é uma oportunidade para reformular todo o sistema de drenagem e implementar obras que previnam possíveis novas enchentes. Mas o plano do governo implementa esse aspecto apenas após os outros já citados.
Orçamento
Estimar quanto será necessário para reestruturar o Rio Grande do Sul e apoiar as famílias atingidas não é uma tarefa fácil, apesar disso, muitos se propõem a fazê-la. No início de maio, uma previsão inicial do governo do Rio Grande do Sul estimou em R$19 bilhões o valor necessário para enfrentar os impactos. Já especialista ouvido pelo Estadão afirma que o custo da reestruturação ficará mais claro após o fim da tragédia ambiental.
A realidade é que ninguém tem noção do estrago que foi feito. Enquanto isso, o governo antecipou benefícios que seriam pagos, como o Bolsa Família e o abono salarial. Mas as negociações para liberar recursos são difíceis, uma vez que ocorrem em meio às restrições fiscais.
Para solucionar esse impasse, os governantes dividem opiniões em relação a tomada de decisões. As medidas em discussão incluem a suspensão temporária do pagamento da dívida do Rio Grande do Sul com o governo federal, autorização de verbas extras além do limite de gastos da União e o remanejamento de despesas do Orçamento federal.
No momento, a maior parte dos recursos está sendo facilitada através de créditos extraordinários, que não afetam as metas fiscais e foram autorizados pelo Congresso com a aprovação de um decreto que estabelece estado de calamidade pública no RS até 31 de dezembro de 2024.
Por outro lado, alguns parlamentares têm defendido a criação de um “orçamento de guerra”, semelhante ao adotado durante a pandemia da covid-19. Isso implicaria na flexibilização das regras fiscais, permitindo ao governo assumir gastos extras. Essa medida é criticada devido à sua possível flexibilização excessiva das regras fiscais. Alguns políticos argumentam que existem alternativas para garantir verba extra para o RS sem a necessidade de alterar a Constituição Federal.
Outra medida é o apoio de bancos como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF), com US$ 1,115 bilhão e US$ 746 milhões, respectivamente.
Projeções para o futuro
Além de determinar o que precisa ser feito primeiro e qual será o orçamento financeiro, o tempo necessário para que tudo volte à normalidade também é um questionamento relevante. Nesse contexto, muitos especulam sobre o que acontecerá.
A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base estimou que a reestruturação do Rio Grande do Sul levará uma década. Já a Federação Internacional da Cruz Vermelha (FICV) é mais otimista, prevendo que o processo levará cerca de um ano.
Na tentativa de projetar o que acontecerá, surgem muitas comparações. Especialistas, por exemplo, comparam os estragos causados pelo furacão Katrina em Nova Orleans, destacando que a recuperação da economia americana levou dez anos. No entanto, são situações e realidades econômicas completamente diferentes para saber se ocorrerá da mesma forma no RS.
Outros especialistas afirmam que cidades inteiras no Rio Grande do Sul precisarão ser realocadas, pois a reestruturação deve considerar áreas mais seguras e resistentes às variações climáticas extremas. Para eles, não faz sentido reconstruir as cidades em locais vulneráveis a grandes inundações durante eventos extremos como o que ocorreu.
Em contrapartida, especialistas apontam que técnicas utilizadas em outros países podem ser aplicadas no Brasil para mitigar os impactos das mudanças climáticas. Um exemplo é o conceito de “cidades-esponja” do arquiteto chinês Kongjian Yu e os parques alagáveis, adotados por cidades na China, EUA e Europa.
Ainda assim, todas essas ações serão sem sentido se os seres humanos continuarem a contribuir significativamente para os desastres ambientais. Segundo especialistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, em um relatório publicado em 2021, as fortes precipitações observadas na região do RS desde a década de 1950 estão relacionadas às mudanças climáticas causadas pela atividade humana.
O que é melhor?
Apesar das medidas propostas pelo governo, poucas oferecem uma solução realmente completa para o problema. Afinal, os benefícios disponibilizados não cobrem todos os custos que os cidadãos terão. Por outro lado, o Estado também não estava preparado para um gasto tão grande de forma repentina.
No momento, é praticamente impossível estimar com precisão o gasto necessário para reestruturar o Rio Grande do Sul. Apesar disso, o governo não pode simplesmente esperar que a situação se resolva naturalmente. Por isso, precisa agir desde já, escolhendo as melhores medidas a serem tomadas a fim de resolver os problemas mais urgentes e começar a reunir recursos para ações futuras.
Além disso, é um desafio prever com precisão quanto tempo será necessário para reconstruir o RS. Embora as especulações forneçam uma base para reflexão, é importante não considerá-las como verdade absoluta, uma vez que as chuvas continuam na região, tornando difícil avaliar completamente a extensão dos danos.
Nesse contexto, é crucial que todas essas medidas sejam cuidadosamente planejadas levando em consideração as consequências econômicas e sociais tanto para o estado quanto para o governo federal. Além de utilizar os recursos disponíveis corretamente, pois não adianta obter financiamento se ele for aplicado de maneira inadequada.