Marta: a rainha do futebol feminino
- 30 de agosto de 2023
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- Theillyson Lima
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Conheça mais sobre a mulher cuja persistência se multiplicou e fez do futebol feminino uma realidade possível para tantas outras.
Ana Júlia Alem
Você conhece a famosa frase “fulano correu para que eu fulano pudesse andar”? Para que hoje, as meninas e mulheres tenham seu espaço dentro do esporte, algumas mulheres precisam correr – e muito. Uma delas foi Marta Vieira da Silva, mais conhecida como “a maior jogadora de futebol de todos os tempos”.
Nascida em 19 de fevereiro de 1986, em Dois Riachos, Alagoas, nunca teve uma infância fácil e precisou batalhar muito para conquistar seus sonhos. Em sua infância, havia apenas sua mãe, seus três irmãos e o prazer de jogar bola. Naquela época, precisava auxiliar no sustento da família, então dividia seu tempo entre praticar a modalidade e vender sacolés e roupas e lavar pratos em restaurantes.
Apesar de seu irmão José não gostar, Marta sempre se colocava entre os meninos na disputa de bola. Com o tempo, a brincadeira de criança se tornou um sonho e uma possibilidade de mudar a vida dela e da família. Marta começou a praticar em uma escolinha de futsal comandada por Tota, seu primeiro treinador.
Com o auxílio de seu mentor, a jogadora disputou a Copa Infantil de Futsal da Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB), em Santana do Ipanema (AL). O time pelo qual jogou era masculino, mas pelo talento diferenciado que tinha, o técnico permitia que Marta participasse. Porém, logo precisou sair do time por conta de uma mudança no regulamento, que passou a permitir apenas a participação de meninos da competição.
Apesar da dificuldade, Tota a ajudou a conseguir dois testes no Rio de Janeiro, um para o Vasco e outro para o Fluminense. Para conseguir participar dos testes, ela precisou trabalhar ainda mais para juntar dinheiro a fim de pagar as despesas. Aos 14 anos, Marta foi aprovada no Vasco e assim sua carreira profissional começou.
As conquistas da rainha do futebol feminino
Após ver todos os prêmios que Marta já conquistou, você percebe que ela não entrou no esporte para brincar! Ela é a maior goleadora na história das Copas do Mundo femininas, a única jogadora – entre homens e mulheres – a marcar gols em cinco Copas do Mundo e a única mulher seis vezes eleita pela FIFA como melhor do mundo. Você pensa que acabou?
Ainda não! Entre tantos jogadores, ela é a única que tem os pés eternizados na calçada da fama no Maracanã e maior artilheira da história da seleção brasileira, com 122 gols. Além disso, é detentora de duas medalhas de prata nas Olimpíadas, duas medalhas de ouro nos Jogos Pan-Americanos, possui dois títulos continentais e sete títulos de ligas nacionais, cinco deles na Suécia e dois nos Estados Unidos.
O que Marta representa para o futebol vai muito além de ter recebido o título de melhor jogadora de futebol do mundo seis vezes. Não são seus títulos que a fazem ser quem é, e sim o caminho que traçou para as mulheres no futebol. Antes, havia um abismo entre uma garota e o sonho de jogar bola. Hoje, há uma ponte que as une.
Go Equal: a busca pela igualdade salarial
Não tem como falar da Marta sem mencionar sua relevância em pautas importantes dentro do esporte feminino. Um dos assuntos debatidos pela jogadora é a desigualdade salarial entre o futebol masculino e feminino. Segundo o jornal Marca, a atleta recebe cerca de US$ 400 mil (R$ 1,95 milhão) anualmente e tem sua fortuna estipulada em US$13 milhões (R$ 63,4 milhões), enquanto o novo jogador do Al-Hilal, Neymar Jr., ganhará € 100 milhões (cerca de R$544 milhões) por ano. O salário do jogador brasileiro fica atrás somente dos de Cristiano Ronaldo e Karim Benzema.
No mínimo, é interessante refletir sobre o motivo pelo qual as jogadoras recebem menos pelo mesmo trabalho. Há quem diga que essa consequência se dá pelo fato de que o futebol feminino é menos rentável do que o masculino, o que gera menos investimento, renda e salários menores. Será mesmo? Elas ganham menos porque participam de um mercado que gera menor remuneração ou porque o mercado paga menos por se tratarem de mulheres?
Desde 2018, Marta não possui contrato com nenhuma marca de material esportivo. Segundo ela, essa decisão se dá por sua convicção de que os valores oferecidos não eram justos. Assim, como forma de realizar um protesto contra a desigualdade de gênero no futebol, ela optou por usar chuteiras pretas, sem marca e com o símbolo de igualdade em rosa e azul. A tradição começou na Copa do Mundo Feminina de 2019 e permanece viva até os dias de hoje.
Na Copa do Mundo Feminina deste ano, a camisa 10 da seleção voltou aos gramados com suas chuteiras e com o objetivo de lançar sua linha de roupas esportivas em parceria com a Centauro, a Go Equal. A campanha, já lançada, tem a missão de dar continuidade ao legado da jogadora e abrir ainda mais espaço para as mulheres no esporte.
Além disso, as marcas envolvidas com o projeto doarão 100% dos royalties arrecadados com as vendas dos produtos para organizações ligadas ao futebol e que buscam o protagonismo feminino na modalidade.
“Bola igual. Campo igual. Regras iguais. Se as mulheres jogam futebol da mesma forma que os homens, por que elas não recebem o devido reconhecimento? O devido apoio? A devida remuneração? Equidade é algo pelo qual devemos todas e todos lutar. Afinal, somos iguais”, diz o texto oficial da campanha Go Equal.
A busca pela igualdade salarial entre homens e mulheres é apenas uma das várias pautas importantes pelas quais a jogadora luta. Não só no esporte, mas em todas as profissões, sejam elas médicas, jornalistas, professoras, advogadas ou atletas. Enquanto nos perguntarmos por que as jogadoras recebem menos que os jogadores, nunca chegaremos a lugar nenhum. Marta, por exemplo, não tem que ganhar um salário à altura do de Neymar, e sim um salário que seja à sua própria altura. Um salário que valorize sua própria trajetória.
Seu legado para o futebol feminino
Além de lutar pela igualdade salarial, Marta também é embaixadora da Organização das Nações Unidas (ONU) na luta contra o sexismo no esporte. Ela faz parte do “Uma Vitória Leva à Outra”, um programa conjunto da ONU Mulheres e do Comitê Olímpico Internacional. Ele tem como objetivo garantir que meninas e mulheres possam participar, trabalhar e desfrutar do esporte em condições iguais.
Por sua determinação de quebrar barreiras impostas pela sociedade e pela sua motivação em fazer com que a modalidade cresça, a atleta acabou se tornando um grande exemplo para mulheres e meninas que têm interesse pelo esporte, mais especificamente pelo futebol feminino.
Para mim, o que Marta representa para as próximas gerações é o sentimento de empoderamento: “se ela consegue, eu também consigo”. Assim, cada vez mais mulheres poderão seguir os passos da jogadora.
Apesar das conquistas, o futebol feminino ainda precisa de apoio
A desigualdade e o preconceito dentro do futebol feminino não acabou, mas assim como tantas outras mulheres, Marta trouxe visibilidade e respeito para o esporte. Graças a ela, existem muitas outras garotas que buscam oportunidades cada vez mais cedo, surgem escolinhas de futebol para meninas e clubes as aceitando com mais facilidade. Assim, cada vez mais, multiplicam-se as dribladoras das barreiras no futebol.
Durante seu discurso, após a eliminação do Brasil na Copa de 2023, a jogadora pediu apoio e valorização ao futebol feminino. “Não vai ter uma Formiga para sempre, não vai ter uma Marta para sempre, não vai ter uma Cristiane e o futebol feminino depende de vocês para sobreviver. Então pense nisso, valorize mais. Chore no começo para sorrir no fim”, diz.
“Eu termino aqui, mas elas continuam”, finaliza a rainha do futebol feminino.