CLARÍN – Sensato: Pero no mucho
- 22 de maio de 2015
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- Thamires Mattos
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Cley Medeiros
A ideia de reduzir a idade na qual jovens podem responder criminalmente como adultos vem sendo debatida na região devido ao aumento da violência impressa nos tabloides e nas mentes. Os meios de comunicação ajudam a construir o sentimento de insegurança, publicando nas capas acontecimentos sem relevância jornalística. Como exemplo, há poucos dias, o Clarín — o jornal de maior tiragem nacional na Argentina — noticiou um assalto a uma pequena loja sem nenhuma consequência fatal.
Com 248.252 exemplares vendidos mensalmente nas bancas pelo país da prata, o Clarín é a publicação que a maioria dos argentinos acordam lendo. O grande meio de comunicação fundado em 1945 tem raízes conservadoras. Envolvido com o golpe militar que depôs Péron, também ergueu a bandeira do terceiro Reich durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), em apoio à Alemanha Nazista. Em suas narrativas jornalísticas, judeus, negros e comunistas eram alvos de intensos ataques. Ainda que não houvesse fato noticioso, a publicação considerava importante cumprir a agenda de Hitler.
Com a reforma democrática pós queda da ditadura em 1983, a idade mínima penal deixou de ser de 14 anos, e subiu para 16 anos. Ao invés do encarceramento, este foi um resultado de intensa reflexão sobre o papel da humanidade diante da oportunidade de direitos. Um ano após o fim da ditadura, o Clarín compra outras empresas de comunicação, no rádio, na TV e consolida sua agenda para a criação de um portal na internet, o qual levaria o nome do grupo “Clarín”. Em 1994 o portal foi ao ar, consolidando a narrativa editorial no dia-a-dia dos argentinos. O aumento dos índices de violência nas capitais durante os anos 90 corroborou a linha editorial dos grandes conglomerados de comunicação. Além disso, a nova Argentina, que se configurava para o capital estrangeiro em seu mercado de especulações, fez com que o debate sobre a redução da maioridade penal se tornasse uma constante nas reflexões dos leitores do Clarín.
Conservadorismo editorial
O apelo de alguns setores argentinos para a redução encontrou guarida nas páginas da publicação a partir das cartas aos leitores, matérias concentradas nas periferias dos grandes centros, perspectiva de juristas e políticos em entrevistas e citações. Os exemplos são as edições de setembro, outubro e dezembro de 2013. No auge da corrida eleitoral presidencial, apareceram títulos como Kirchner a favor da violência, em referência a declaração desfavorável a redução da maioridade penal da então candidata Cristina Kirchner. Ainda que o impresso contemple as preocupações do que seria uma redução para os 14 anos, como seu editorial de 3 de novembro de 2013 que dizia isto: “reduzir a idade penal seria desastroso diante da realidade das prisões do país…”, em vários títulos de matérias decide noticiar algum crime relacionado à adolescentes de maneira sensacionalista.
No país, há cerca de 19 mil menores que cumprem medidas socioeducativas. Segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Nação, destes, menos de 2% são considerados delinquentes por crimes considerados violentos, como roubo seguido de morte (latrocínio) e assassinato.
Apesar da polêmica, o fato é que as cifras oficiais mostram que, na Argentina, crime e idade de punição não têm relação. Os dados da Procuradoria Geral da Suprema Corte do Estado de Buenos Aires — órgão oficial que concentra os promotores e rende todas as causas penais que são abertas no estado mais populoso do país — são categóricos: em 2012, 4,3% do total de delitos foram cometidos por menores de 16 anos. Os outros 95,7%, por maiores de idade. Menos de 1% dos homicídios foram protagonizados por jovens. Dos 30 mil crimes cometidos por jovens, somente três foram sequestros extorsivos.
Real problema
A Argentina é um dos poucos países do continente com jovens — seis — condenados à prisão perpétua. Essa situação fez com que o país chamasse a atenção da Corte Interamericana de Direitos Humanos que exigiu a adequação imediata da legislação penal juvenil às disposições internacionais de proteção à juventude.
Embora o jornal faça lobby para conservadores, o Clarín publica, também, entrevistas com autoridades penais contrárias a redução da maioridade penal. Assim, possibilita um jornalismo de qualidade através do debate entre ideias antagônicas.
“A maioria dos juvenis em medidas penais hoje, vieram do narcotráfico, sendo elas recrutadas por traficantes, estes com idade plena de consciência, ainda assim, quando essa situação de recrutamento juvenil é detectada, não há um aumento da gravidade das penas para os maiores: o recrutamento não está previsto em nenhum artigo do código penal. Trata-se de uma ausência sobre a qual nenhuma força política até agora se pronunciou”, diz Eugenio Raúl Zaffaroni, ministro da Suprema Corte Argentina e diretor do Departamento de Direito Penal e Criminologia na Universidade de Buenos Aires para o jornal Clarín de 2 de dezembro de 2014.