Covid-19 e Bolsonaro: uma análise da visão de Angola sobre o Brasil
- 16 de março de 2022
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Como a gestão do presidente brasileiro mudou o pensamento de um país.
Helena Cardoso
É fato que todos os países enfrentaram dificuldades sociais e econômicas durante a pandemia, mas não é difícil notar que alguns se afundaram mais que outros. A covid-19 ampliou as desigualdades já existentes e colocou muitas famílias em crises financeiras. Quanto menor o poder de compra, menor a procura por produtos que antes vendiam facilmente. Com o petróleo não foi diferente: a redução na procura resultou na diminuição de preço e produção.
Países dependentes de exportações petrolíferas, como Nigéria e Angola, encontraram obstáculos para se manterem economicamente ativos durante esse período. O que preocupa economistas, em especial angolanos, é a permanência na baixa do preço dos barris. Em entrevista ao Novo Jornal, da Angola, o economista Carlos Rosado de Carvalho diz que “a longo prazo, se o preço do petróleo continuar baixo, a moeda poderá desvalorizar e a vida dos angolanos ficará mais difícil.”
Em uma análise feita desse portal de notícias angolano nos últimos três anos sobre matérias relacionadas ao Brasil, percebi a grande quantidade de notícias que falam especificamente sobre a pandemia. Só a respeito da suspensão de voos entre Angola e Brasil foram seis – sendo dois sobre a suspensão propriamente dita e quatro sobre o retorno das rotas. Outros textos colocam ainda o Brasil como “celeiro” de novas variantes do vírus e o apontam como um dos países onde há mais propagação da doença.
Nesse sentido, é possível perceber a grande quantidade de matérias que explicitam a animosidade entre Angola e Jair Bolsonaro. Mais de 10 matérias possuem pelo menos um trecho que fala sobre o “comportamento negacionista” do presidente brasileiro. Um exemplo é a notícia de setembro de 2021 sobre Bolsonaro apresentar recusa à vacina, mesmo sabendo que essa é uma exigência para comparecer ao evento da Assembleia Geral das Nações Unidas (Agnu), na Organização das Nações Unidas (ONU), para o qual havia sido convidado. A matéria diz: “a postura de Jair Bolsonaro deverá permitir-lhe, mesmo sabendo-se que este tem pautado a sua ação enquanto líder do maior país da América Latina vacilando entre o negacionismo da gravidade do novo coronavírus e o desafio às normas mais elementares de proteção comum, ser uma das figuras desta AGNU.”
O marco de 500 mil vítimas da covid-19 no Brasil também foi coberto pelo Novo Jornal, que declara: “Mais de meio milhão de pessoas mortas. Este é o balanço trágico da Covid-19 no Brasil, um dos países mais duramente atingidos pela pandemia e um dos que é apontado como melhor exemplo das consequências de uma desadequada resposta à pandemia por opção política do Governo do Presidente Jair Bolsonaro, que resultou da não aceitação da gravidade desta doença […].” O jornal angolano acrescenta ainda que “face a este cenário trágico, o Governo do Presidente Jair Bolsonaro persiste na estratégia de desdramatização dos efeitos da doença alegando que a economia e o país têm de continuar a funcionar”, além de utilizar expressões como “desleixo”.
Mas essa animosidade por Bolsonaro não veio só depois da covid-19. Ela é tão antiga quanto a candidatura do atual presidente, em 2018. Nas manchetes desse período, podiam-se ler coisas como “Brasil/Eleições: O radical de direita contra o radical de…Lula da Silva”. Essa matéria, especificamente, chama Bolsonaro de racista e xenofóbico.
É fácil notar as diferenças entre as manchetes que falam sobre as eleições de 2018 e as de 2022. Neste ano, enquanto Lula lidera as pesquisas de intenção de voto, a matéria publicada diz que “Lula arrasa Bolsonaro em sondagens sucessivas”, e a foto de ilustração é do ex-presidente. Quando Bolsonaro liderava contra Haddad, em 2018, a manchete dizia: “Brasil ‘ferve’ nas ruas contra candidato fascista e racista nas eleições Presidenciais de domingo”, e a foto é de protestos. O artigo utiliza também termos como “fascista assumido”, “homem que representa o passado ditatorial” e “Haddad, o antídoto contra o fascista”.
Mas será que a visão sobre o Brasil é só essa? Será que o pensamento do Novo Jornal pode ser resumido a “Brasil tem muita covid-19 e odiamos Bolsonaro”? Embora as matérias mais recentes sejam pautadas nesses dois temas, é possível perceber outras que deixam claro a relação de amizade que Angola sente pelos brasileiros. Segundo o portal, essa parceria pode ser explicada pela aproximação linguística e histórica entre ambos. O termo “relações bilaterais”, por exemplo, é muito utilizado em artigos que falam dessa compatibilidade. Outro ponto que influencia a afinidade é o fato de o Brasil ter sido o primeiro país a reconhecer a independência da Angola, em 1975.
Analisando o portal de notícias angolano Novo Jornal, é possível dizer que a visão do país africano sobre o nosso é ampla. Tentar encaixar esse pensamento em apenas um texto é limitá-lo. O que podemos entender ao ler esses artigos são vários aspectos que se interligam e formam uma mensagem plural sobre o Brasil. Porém, ao olhar superficialmente, uma ideia se destaca: a ideia de que manter boas relações entre os países é considerada fundamental.