Coraline – Cuidado com o que você deseja
- 7 de outubro de 2021
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Você provavelmente acha que este mundo é um sonho bonito, mas você está errada.
Adalie Pritchard
A opinião mais popular sobre Coraline é que este não é um filme para crianças. Porém, tem uma classificação L (livre para todos os públicos) por ser direcionado aos menores. A obra cinematográfica não contém nenhum tipo de violência. O filme é assustador sem recorrer a fortes barulhos altos instigando medo. Como é que um filme para crianças feito com estatuetas em stop-motion, consegue ser mais inquietante do que o típico filme de terror?
O estúdio Laika baseou o filme no livro infantil (2002) escrito por Neil Gaiman. O fato de o livro ser considerado ainda mais assustador do que o filme, é prova de que a essência e valor da história está em suas temáticas e conceitos, ao invés dos detalhes cinematográficos. Ele brinca com nossos medos mais profundos e desejos de pertencer.
Coraline, uma criança curiosa de 11 anos, acabou de se mudar ao palácio cor-de-rosa, uma velha casa vitoriana. A menina encontra uma boneca igualzinha a ela, além de uma portinha escondida que chega a um mundo paralelo, perfeito aos olhos dela. Sua “outra” família dá toda a atenção que ela mais deseja de seus pais verdadeiros. A desvantagem é que para ficar para sempre, sua outra mãe demanda que os olhos sejam costurados com botões.
Eventualmente, Coraline percebe que sua utopia é um engano, e começa a valorizar os pais com todos seus defeitos, isso depois de achar que os tinha perdido. Talvez nosso temor ao acompanhar a aventura não seja pelos elementos sinistros como a boneca ou a família paralela com olhos de botões, nem a mãe que se transforma em uma aranha, e sim o sentimento de ser uma criança negligenciada. No fim das contas, a maioria dos nossos medos têm origem em nossas infâncias.
Não apenas um, mas dois mundos tenebrosos
Ao contrário do que vemos em personagens de muitos filmes, Coraline não tem uma vida bonita que a faria desejar voltar para casa. O diretor provoca o mesmo posicionamento na audiência sobre o futuro da criança pela construção das cenas do mundo real. Sua casa é muito velha, suja e o mundo pintado em tons melancólicos de cinza. A imaginação é a única salvação do tédio. Além disso, os vizinhos excêntricos são totalmente desconhecidos. Desta forma, ela enfrenta dois mundos tenebrosos por nos dois lados da porta.
Uma vida com a outra família pode parecer perfeita. Coraline teria comida gostosa, roupa nova, espaços recreativos para brincar, e o mais importante, atenção. No entanto, antes do clímax da obra, dá para perceber que alguma coisa não está bem. Uma vida perfeita não é realmente desejável. Em uma citação do livro, ao entender este conceito, a heroína expressou: “Eu não quero tudo o que eu quiser. Ninguém quer. Não realmente. Que graça teria ter tudo o que se deseja? Em um piscar de olhos e sem o menor sentido. E daí? ”
Nossos mundos paralelos personalizados nos pareceriam vazios. Pois a procura da felicidade constante como a meta final da vida é indesejável. É preferível uma existência com significado. Essa grande lição permitiu a Coraline Jones aceitar e amar seus pais do jeito que são. Cabe lembrar que quem te oferece a terra, o céu e todas as estrelas, está mentindo para você.