Terra arrasada
- 15 de maio de 2018
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- Thamires Mattos
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A forma deturpada como os canais de TV tratam o assunto da Venezuela é insuportável e faz parte de um jogo sujo democrático
Thais Fowler
Tudo o que acontece na Venezuela é cercado de desinformação e poluído pelas fakenews espalhadas por apoiadores do Governo e da oposição. Na política venezuelana, tudo é espetáculo. Para além disso, qualquer informação que recebemos de lá é filtrada pelas lentes ultrapolarizadas do diálogo político do Brasil. O que acentua ainda mais a gravidade da situação é que a Venezuela está isolada, perdendo apoio internacional e credibilidade a cada dia, e sem crédito para reverter esse cenário. Nos últimos 18 anos, a Venezuela recebeu 1 trilhão e 900 bilhões de dólares via petróleo e impostos. Mais de cinco vezes a receita dos 40 anos de democracia. Foi um período de bonança.
Contextualizando
O histórico recente da Venezuela, pode ser colocado como um marco. A eleição de 1989 põe Carlos Andrés Perez no poder. Perez, que já havia sido presidente da Venezuela na década de 70, assume a Venezuela com uma pesada dívida externa, um grande desiquilíbrio fiscal e uma questão distributiva muito complicada. Passa então a ter um governo com propostas de liberação da economia, de consertar esse desiquilíbrio. Isso leva uma série de protestos, o mais famoso deles é o do Caracazo (1989), além de duas tentativas de golpe. Uma delas em fevereiro de 1992, liderada pelo então tenente coronel, Hugo Chávez, que se torna uma figura de relevância nacional.
Outra em novembro de 1992, que foi dirigido por um grupo de jovens oficiais militares, leais às ideias chavistas e ao movimento revolucionário bolivariano. A ideia era que jovens militares fossem a salvação do país. Carlos Andrés Perez sofre um impeachment em 1993 por ter embolsado indevidamente parte de seu fundo partidário e é deposto pelo que seria a suprema corte venezuelana. Foi um processo de impeachment extremamente polêmico. Ele entrega o poder a Ramon Velásquez, um veterano da política venezuelana que já havia sido presidente, no final da década de 60. Mas que, nas eleições de 1998, perde para Hugo Chávez. O novo presidente assume o governo com a proposta de uma quinta República Venezuelana, de refundar a Venezuela. E logo depois, propõe uma nova constituinte que é aprovada em um referendo. Chávez fez uma aposta muito ousada que foi mexer na economia venezuelana levando para uma outra direção. No novo rumo, o Estado exerceria um papel centralizador de planificação da economia e isso foi feito de uma forma democrática.
Foco no processo
Após governar por 14 anos Chávez falece em 2013. E é aí que acontece uma nova eleição onde vão concorrer Nicolás Maduro e Henrique Capriles. Nicolás Maduro ganha as eleições e reorganiza suas próprias estruturas de poder, de forma diferente das de Chávez. Parte dos chavistas estão se tornando cada vez mais críticos ao governo do Maduro, o que dividiu o povo entre chavistas e maduristas. Além disso, o governo de Maduro vem sendo sacudido por uma crise econômica sem precedentes, manifestações diárias, condenações de atores internacionais.
Três em cada quatro cidadãos venezuelanos relatam perda involuntária de peso de quase 10 quilos, em média, por ano, graças a fome. Quase 90% da população afirma não ter dinheiro para comprar alimentos. A desnutrição infantil atingiu quase 20% da população com menos de cinco anos. A crise de desabastecimento é atroz: a escassez chega a 80%, atingindo itens da cesta básica e remédios. Pra piorar o cenário, o povo convive com apagões diários, que duram quatro horas. A produção interna não tem capacidade de mitigar esse sofrimento: 60% das indústrias desapareceram e a produção agrícola, bem como o setor de serviços, caiu 40%.Como o país com a maior reserva de petróleo do mundo, um forte candidato a ter um dos IDHs mais altos do planeta, se encontra nessa situação?
No meio dessa confusão os meios de comunicação expõem o caso da Venezuela de uma maneira muito clara, uma Venezuela em convulsão. É emocionante ler sobre a Venezuela e ver como nela existem muitos pontos parecidos com o Brasil. O bom uso da mídia foi uma das estratégias de Chávez enquanto governou. Ação que permitiu que o povo conhecesse o governo e seus exercícios de uma forma particular. Mesmo assim a imagem de Chávez na mídia sempre foi polêmica. O jornal Estadão publicou uma matéria a respeito do controle do governo Maduro sobre a mídia. De acordo com o texto, o controle da mídia para o Governo de Maduro é essencial, pois só a imprensa livre é capaz de mostrar que a maior fonte de corrupção na Venezuela é o próprio governo. Ao ler isto pode-se perceber que a forma deturpada como os canais de TV tratam o assunto é insuportável e faz parte de um jogo sujo democrático. Não existe democracia se não existe acesso a informação.