E quando o entusiasmo da novidade acabar?
- 26 de setembro de 2016
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- Thamires Mattos
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Por que não falar sobre os impactos da realidade virtual no cérebro humano? E os conflitos de identidade que podem ser gerados? Muito pouco se fala!
b> Thaís Alencar
O que há alguns anos poderia ser considerado uma impossibilidade, hoje é real. A realidade virtual é mais um fruto da evolução da tecnologia. Através do uso de um óculos especial, por exemplo, o usuário pode ser transportado para outra dimensão e “vivenciar” situações tão diversas quanto as que um computador é capaz de criar. Esta ferramenta foi recebida com entusiasmo por diversos especialistas e, ao que parece, o grupo Globo também deixou-se contagiar por tal animação.
O tema da Realidade Virtual já foi pauta de diversas matérias e inclusive assunto de um programa matutino da emissora de TV. Em quase todos os casos, a questão é apresentada como uma evolução tecnológica promissora demais. Através dela, será possível mudar a forma de se transmitir conhecimento às crianças, tratar pessoas com fobias, oferecer uma sensação de liberdade aqueles que são limitados de alguma forma e etc.
Há pouco mais de 1 mês o Fantástico (revista eletrônica transmitida semanalmente pela TV Globo) exibiu uma matéria que expunha como a realidade virtual poderá ser aplicada no acompanhamento da gestação humana. Apesar da super exploração da emoção dos futuros papais ao ter contato com o feto, um dos especialistas entrevistados esclareceu que o objetivo principal do uso da tecnologia é aprimorar a maneira como são realizadas as cirurgias em fetos.
O que incomoda ao ver essa cobertura romântica do tema é pensar sobre até que ponto o canal de televisão tem cumprido seu papel de gerar a discussão necessária sobre o tema. Afinal, da forma como tem sido exposta, a realidade virtual está se tornando um objeto de desejo e a promessa é que se torne cada vez mais acessível. Prova disso, é uma reportagem exibida por outro programa do canal, o Como Será. O vídeo tratava sobre a iniciativa de jovens na Amazônia de criar um óculos de realidade virtual com apenas um smartphone com acesso à internet e fibra de carbono.
Este texto não tem a intenção de dizer que esta tecnologia é de todo ruim ou que não pode trazer algum desenvolvimento. No entanto, a questão é: por que não falar sobre os impactos da realidade virtual no cérebro humano? E os efeitos da exposição do usuário a esta ferramenta? E os conflitos de identidade que podem ser gerados? Muito pouco se fala. Há psicólogos que afirmam, por exemplo, que o cérebro não é capaz de entender a realidade virtual como uma situação inventada. Por mais que a razão entenda que tudo aquilo é mentira, o subconsciente absorve como realidade. Portanto, especialistas confirmam que ao expor uma pessoa com fobia ao objeto do seu medo, se o devido cuidado não for tomado, pode-se gerar um trauma e este não será virtual.
Pintar a realidade virtual como uma nova ferramenta para a educação básica é importante, mas porque não tratar dos riscos de expor as crianças a este tipo de ferramenta? Seria de suma importância trabalhar este tipo de resposta em respeito aos pais que, como leigos, na maioria das vezes não sabem nem como funciona a ferramenta, que dirá entender os riscos a que seus filhos estão sendo expostos.
Dado o poder de influência de um veículo de comunicação como a Globo, a responsabilidade de apresentar uma nova tecnologia deveria ser cuidadosamente considerada, pois os efeitos dela na nossa sociedade poderão ser notáveis. É possível que, por estar despontando agora, pouca ideia se tenha destes efeitos. No entanto, a longo prazo será possível colher os frutos. Esperava-se que os pontos positivos e negativos do tema fossem expostos de maneira balanceada a fim de oferecer ao espectador a oportunidade de entender e decidir por si mesmo quanto ao uso (ou não) da tecnologia.
O que percebemos é que, neste caso, a imparcialidade foi soterrada pelo entusiasmo da novidade. Talvez o maior prejudicado com essa abordagem seja o grande público que só tem este veículo como fonte de informação. Para este, são estas reportagens que vão reger muitas conversas familiares e discussão entre amigos. O preocupante é que as pessoas estarão vendo apenas um lado da moeda. Tirando conclusões a partir de uma abordagem unilateral cujas consequências poderão afetar a vida de toda uma sociedade. Espera-se que quando a animação pela novidade acabar, não seja tarde demais.